Asilo construído pela elite para acabar com moradores de rua do Centro, em 1910, virou exemplo de amor ao próximo

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A creação desse asylo, alem de ser uma medida humanitária, é o meio de afugentar a muitos, que pedem esmolas por ociosidade e preguiça, em logar de procurarem ganhar a vida pelo trabalho. É de indeclinável necessidade estabelecer-se um asylo para elles, afim de evitar-se que continuem a esmolar pelas ruas e praças publicas, incommodando aos transeuntes”.
Foi com esses argumentos que o presidente da Província de Santa Catarina, João Rodrigues, sugeriu, em 1881, a criação do atual Asilo Irmão Joaquim, que foi construído em 1910 e está completando 112 anos.

No final do século 19 e início do século 20, parte da população de Florianópolis era composta por mendigos, ex-escravos e pobres que formavam um contingente de indigentes.
Por isso, a elite local decidiu promover a construção do “Asylo de Mendicidade Irmão Joaquim”, na atual Avenida Mauro Ramos.
As informações constam na tese de doutorado em Geografia “Do Mar ao Morro: a geografia histórica da pobreza urbana em Florianópolis”, de autoria de André Luiz Santos (UFSC, 2009).

Imagem do Centro na década de 1920 já mostra o asilo (Acervo IHGSC)

O viés higienista da época também é mencionado no próprio site do asilo Irmão Joaquim, “uma instituição centenária constituída para cuidar dos pedintes que circulavam em Florianópolis”.
E continua: “A construção fez parte de um processo de modernização e higienização que a cidade viveu nas duas primeiras décadas do século 20, época em que a água potável foi encanada e foram construídas as redes de esgoto e de energia elétrica”.

Jornal A Fé divulgava ações de solidariedade da Associação Irmão Joaquim

Jornais registram maltrapilhos e famintos
A pobreza extrema era observada principalmente em mulatos, mas existiam também brancos em situação de miséria, que a imprensa da época chamava de “maltrapilhos, famintos, ulcerados e aleijões”, que habitavam o submundo da cidade.

Imagem de jornal A Fé, de 1925

O jornal “O Estado”, por exemplo, narrava episódios dantescos de gente jogada em porões e sob pontes, conta o professor Nereu do Valle Pereira, no livro “Associação Irmão Joaquim – 100 anos de amor ao próximo”.

Grandes comerciantes viabilizam obra
A primeira etapa do asilo tinha capacidade para 20 internos, e abrigava somente homens. A conclusão da ala esquerda do prédio, em 1911, abrigava 20 mulheres.
A construção só foi possível graças às doações da elite local.
As contribuições mais importantes foram feitas pelas famílias Hoepcke e Wendhausen, maiores comerciantes da cidade no início do século XX, como mostra o jornal A Fé, de 31 de outubro de 1909.
Mas logo, a empreitada foi assumida por outros conterrâneos, como registrado no Jornal Republica, de 21 de fevereiro de 1920.
“Em 1919, o “Asylo Irmão Joaquim” era mantido por 255 associados. Abrigava, no início daquele ano: 38 “exilados” homens e mulheres, dos quais 32 brancos e 6 negros, 17 tinham mais de setenta anos, 31 eram brasileiros e 7 estrangeiros, alguns descritos como: “cegos, aleijados e imbecis”.

Caminhada de solidariedade
Com o passar dos anos, o Asilo Irmão Joaquim se transformou numa entidade exclusivamente focada no amparo à velhice, que ainda se mantém com doações.

Imagem de Billy Culleton

Atualmente, abriga 22 homens e 14 mulheres, com idades entre 60 e 98 anos.
Além da hospedagem, são fornecidas seis refeições diárias, atendimento médico, fisioterapia e atividades de lazer.

Manutenção
As despesas do asilo, que conta com 30 funcionários fixos e três profissionais voluntários, são financiadas basicamente por renda própria da Associação Irmão Joaquim, doações, convênios e uma pequena participação dos abrigados com condições de pagamento.
O alto volume de recursos necessários para manutenção dos serviços exige uma constante busca por fontes alternativas de financiamento.

Veja os vídeos sobre o maravilhoso trabalho desenvolvido atualmente no asilo:


Como ajudar?
Neste momento de pandemia, a instituição precisa ainda mais da ajuda da comunidade.
Por isso, aceita qualquer tipo de doação, seja de mantimentos, roupas ou dinheiro.
E disponibiliza colaborações por meio da conta da Celesc ou através do cartão de crédito: mais informações pelo WhatsApp (48) 99800-5367.

Grades do asilo cercavam a Praça XV
Confira a reportagem: As grades que cercavam a Praça XV há mais de um século estão pelo Centro. E você já passou por elas!

Quem foi Irmão Joaquim?
Joaquim Francisco da Costa, mais conhecido como Irmão Joaquim, nasceu em Desterro, em 20 de março de 1761.
Filho de açorianos, assumiu a vida religiosa e, em devoção à Nossa Senhora do Livramento, trocou seu nome para Joaquim Francisco do Livramento.

Irmão Joaquim (Acervo do Senado Federal)

Dedicou a vida aos doentes e necessitados. Com o dinheiro de esmolas e doações, construiu, em 1789, o primeiro hospital de Santa Catarina voltado à caridade: o Imperial Hospital de Caridade.
Mais tarde, fundou hospitais em outras cidades brasileiras, como Porto Alegre e Salvador.
Fundou ainda escolas, asilos e seminários em São Paulo e no Rio de Janeiro e empreendeu viagens à Europa em busca de recursos para financiar suas obras.
Morreu em Marselha, na França, em 1829, aos 68 anos, em sua viagem de retorno ao Brasil.

Em 2018 foi incluído no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria, que contem o nome de 43 personagens considerados fundamentais para a construção da história brasileira, como Anita Garibaldi, o líder Zumbi dos Palmares, Heitor Villa-Lobos e Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.

(Esta reportagem foi feita a partir da pesquisa da tese de doutorado em Geografia “Do Mar ao Morro: a geografia histórica da pobreza urbana em Florianópolis”, de autoria de André Luiz Santos, UFSC, 2009, do site do Asilo Irmão Joaquim, da Agência Senado, e de jornais antigos como A Fé e O Estado).

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