O Parque da Luz já foi morro – Entulho do antigo cemitério, com ossadas, foi usado para aterrar a Beira Mar Norte

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Por Billy Culleton
Em 1960, começaram as obras do aterramento que deram origem à Avenida Beira Mar Norte.
Para isso, terra e entulho carregados por caminhões foram ganhando terreno sobre o mar.
E a principal fonte foi o morro mais próximo, onde funcionou o cemitério municipal até 1924 e que atualmente é o Parque da Luz.

Parque da Luz na década de 1990 (Arquivo pessoal)

Fotos do início do século passado mostram que a área tinha uma altura de, pelo menos, 50 metros.

Foto desde o Continente, de 1910, mostra a elevação do cemitério (Acervo Antônio Pirajá Martins da Silva/Casa da Memória)

Num mapa de Desterro de 1774 o local é denominado Monte de Rita Maria.

No centro da planta, Monte de Rita Maria (acervo de Rodrigo Dalmolin)

Quando o cemitério foi desativado, dois anos antes da inauguração da Ponte Hercílio Luz, os restos mortais foram transferidos para o atual Cemitério do Itacorubi.

Mas, nem todos!
Como descreve a historiadora Elisiana Castro.
“Os termos de exumações apresentam aproximadamente 800 exumações e algumas retiradas de ossadas, não permitindo afirmar a transferência de todos os que ali estavam enterrados”, relata ela, na pesquisa “Aqui jaz um cemitério: a transferência do cemitério público de Florianópolis (1923-26)”, da Universidade Federal de Santa Catarina.
Isto porque, os termos de exumações apontam que o número de sepultados aproximava-se dos 30 mil, na época da transferência.

O cemitério visto desde a Ilha: já tem guindastes trabalhando na construção da Ponte (Casa da Memória)

Na Praça da Bandeira, terra com ossadas
A mudança deixou para trás alguns túmulos, ossos e lápides, que se transformaram em entulho para aterros por toda a cidade.
Logo após a desativação do ‘campo santo’, o que sobrou (terra e escombros com ossos e lápides) foram usados, por exemplo, para o aterramento da Praça da Bandeira, na frente da Assembleia Legislativa.

Praça da Bandeira (Divulgação: TJ/SC)

“A terra era carregada por carroças, caçambas e caminhões. Na Praça da Bandeira, se encontravam ossadas dos defuntos que foram tirados junto com a terra do cemitério”, contou o florianopolitano Waldir Vargas, em depoimento a Edna Rosa, autora da pesquisa “A relação do crescimento urbano de Florianópolis com as áreas dos cemitérios”, divulgada pela UFSC, em 1998.

Historiador de 91 anos relembra aterro
Décadas depois, o local que era chamado de Colina da Vista Alegre, Morro do Barro Vermelho ou, simplesmente, Morro do Cemitério foi a principal ‘jazida’ para a construção da Beira Mar Norte.
No início, a avenida tinha quatro pistas, duas para cada lado. Só na década de 1980 é que foi ampliada para seu formato atual.

Embora o Floripa Centro não tenha encontrado registros oficiais sobre o uso do morro para o aterro, a tradição oral ‘dos mais antigos’ confirma o fato.
“Lembro perfeitamente dos caminhões sendo carregados no antigo cemitério para construir a Beira Mar”, conta o professor Nereu do Vale Pereira, de 91 anos, um dos mais antigos historiadores vivos de Florianópolis.

E, assim, o local que sedia o agora ‘aplainado’ Parque da Luz passou por duas grandes transformações em menos de um século: deixou de ser cemitério… e deixou de ser morro!

Em 1925 (foto de Felipe Bündgets) e em 2020 (foto Billy Culleton)

Confira mais fotos da área (a foto de abertura é de Felipe Bündgets, na obra ‘Ponte Hercílio Luz, do sonho à realidade’):

Novas informações a partir da interação dos leitores:
“Vale lembrar uma curiosidade:
O administrador do ‘novo’ cemitério do Itacorubi, tio avô do também historiador Ney Cláudio Franzoni Viegas, ficou semanas para inaugurar o cemitério.
Não morria ninguém!
Advinha quem foi o primeiro a ser enterrado!?
O próprio! Ora, ora!”
(Ricardinho Machado)

“Outra curiosidade sobre cemitérios antigos de Florianópolis.
Atrás da igreja São Francisco tem o Centro comercial “ARS”, praticamente o primeiro shopping da cidade e primeiro prédio da cidade com escada rolante.
Onde hoje se situa o ARS, era o cemitério da igreja São Francisco, que por tradição, cemitérios eram edificados ao lado ou nos fundos das igrejas.
Lembrando que era também, normal sepultar os “nobres”, dentro das igrejas.”
(J.I.Cibils)

“Na realidade era o Monte de Rita Maria, basta consultar a planta da vila de 1774” (Rodrigo Dalmolin, que enviou o mapa em que aparece escrito o Monte de Rita Maria)

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