Diário da Quarentena – Os dias de isolamento deveriam ter 30 horas, como os bancos!

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Por Marcos Castiel *

Pensa num sujeito hiperativo! Multiplica ao cubo.
Tipo o seguinte: imagina esse cara assim: corredor de maratona (muitas vezes treina de 2 a 3 horas por dia, seis dias por semana); o sujeito ainda cursa a terceira faculdade de sua existência e planeja, depois dos 50, mudar seu campo de trabalho da área de humanas para área de saúde!

Espera, dá para colocar pimenta! Bom, o cara ainda é pai de dois filhos e tenta morar em duas cidades ao mesmo tempo.
Numa, Porto Alegre, faz faculdade e estágio na prefeitura, atendendo numa clínica de um bairro pobre da cidade.
Na outra, Floripa, visita um dos filhos (a filha, na real, já que o filho mora com ele em Porto), e sua mulher e sua cachorrinha, geralmente nos finais de semana.

Tá inviável? Então imagina tudo isso, trabalho, filhos, corridas, duas cidades, estudo e o cara tá numa vibe de aprender hebraico!
E ler a literatura técnica, mais artigos de sua nova área, mais fazer as tarefas da faculdade. Ainda dar uma trabalhada no antigo trampo de mídia para o sustento!
Pois é, agora pega ele e tranca em casa, sem aviso prévio!

Lembrando que o sujeito cinquentenário se desloca na cidade de bicicleta para seus compromissos!
Pois é, o Corona colocou vários tipos de pessoas em quarentena: mas este cara, euzinho, o condenou ao desafio dos desafios.

O vírus certamente pensou em sua minúscula existência.
Como pará-lo? Afinal não teve maratona, tese de pós-graduação, desafio laboral, nada, absolutamente nada, que o detivesse!
Mas o vírus tinha um plano.
O ser vivo que não é vivo (ou é, sei lá, ninguém sabe) projetou uma cilada, um laço de passarinheiro, o que de mais insondável haveria para esta mente inquieta, para essa alma insaciável: parar.
Abstrair; não se locomover; desacelerar!

(A crônica continua após o vídeo, mas se preferir ouvir o próprio Marcos Castiel contando a sua história…)

A todos que acham difícil estar em casa nesse momento, entre no corpo deste inquieto, na mente presa entre quatro paredes deste homem, na alma aprisionada deste incontrolável ser quântico!
Não é possível sequer imaginar o contexto, nem mesmo se solidarizar com o escriba, simplesmente por não ter referência. Então, te conto o que ele fez…

Sabe, a depressão era uma opção. O dolce far niente, regado a séries de TV e alguns traguinhos também era possível.

Mas preciso te dizer que mentes assim cocriam realidade.
O que faria trancafiado em casa uma mente que já aprendeu inglês para cobrir uma Olimpíada em Londres, rudimentos de chinês para cobrir a Olimpíada em Pequim, Espanhol para cobrir a Copa no Uruguai e para entender os amigos argentinos que ama tanto!
Ora, aproveitaria o confinamento para aprender hebraico, certo? Certíssimo! E assim, fez!

Bom, as aulas EAD da faculdade vieram ao natural e a galope.
Então, estudar pelas manhãs era só a cerejinha do bolo. Faltaria mais para este ser, vocês agora concordam, né!?

E sacudir o esqueleto, qual a solução?
Ora, simples: correr loucamente nos corredores de casa, por incontáveis minutos e vai-e-vens até perfazer distâncias de longões.
Inclusive fazer isso em uma live para compartilhar tal possibilidade com amigos.
Isso é algo que você faria, né? Não? Sério? Não entendo estes humanos.

Mas só correr? Oras, porque não procurar a triatleta e professora de educação física, sua amigona Sara, para planejar exercícios para você? Feito!
E seguir as aulas de sua assessoria desportiva, ministradas pelo Guilherme e pelo Remiâo? Feito!

Sei, você cansou só de ler, imagina um louco fazendo tudo isso em casa?
Mas não dá para ser egoísta né!
Afinal, confinamento pede introspecção e a busca da convivência!
Então, você ajuda a lavar a louça, a limpar os armários, a pentear os longos fios de sua lhasa e a secá-la, pacientemente, após o banho caseiro dado pela heroica dona Angela!

Bom, as 24 horas pareciam repletas. Mas era preciso preencher 30 horas.
Porque se tem banco 30 horas, tem que ter ser humano 32 horas!
Então o cocriador de realidade entrou em ação e pensou: ora, tenho que me acalmar de algum jeito. Então, buscou encaixar meditações e orações.

Dá para dizer que, dentro de casa, agora, estava mais legalzinho, mais parecido com sua vida original. Mas faltava algo ainda.
Afinal, por incrível que pareça, o capricorniano louco viu que sua agenda lhe permitia estudar, treinar, ser pai, marido e ainda sobrava um tempinho! Acredite!

Então, ele resolveu aproveitar que em breve estará formado em Nutrição e partiu para preparar suas redes sociais.
Só tinha um porém: ele que sempre comandou equipes, nunca a si mesmo, precisava orientar, ralhar e ralar consigo mesmo!
Confesso: fiquei várias vezes indignado com minha inaptidão em certos afazeres, pensei em demitir a mim mesmo. Mas voltei atrás e mantive o funcionário.
Valeu a pena.

Mas eu escrevi isso tudo para te perguntar uma coisa e te pedir outra!
Perguntar se tu tá mesmo achando difícil ficar em casa?

E te pedir para ser meu paciente de Nutrição Funcional e esportiva daqui a um ano!
Bom, era isso.
Não escrevia tanto desde que larguei a carreira de jornalista.
Mas tô um pouco preocupado: acho que quando formos autorizados a retomar a vida normal, não conseguirei abandonar a nova vida doméstica.
Será impossível?

* Jornalista e nutricionista em formação

O Floripa Centro criou este espaço para que moradores da região central de Florianópolis possam partilhar como estão passando a quarentena, enquanto o coronavírus não passa!

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Escreva o seu depoimento (entre 2 mil e 5 mil caracteres com espaço) e envie para portalfloripacentro@gmail.com, junto com fotos do autor no isolamento.

Se desejar, também pode mandar um pequeno vídeo.

 

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