Sítio arqueológico a céu aberto no Centro – Qualquer um pode recolher material que conta a história de Florianópolis

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Por Billy Culleton
Fragmentos de cerâmica indígena com centenas de anos, além de louças, tigelas e vasilhames do século 19 são alguns dos objetos que podem ser encontradas na praia frente ao Forte Santana, na Avenida Beira Mar Norte, na região central da Capital.

No início, parecia um grande furo desta reportagem, descoberto por acaso em visita in loco ao local.

Investigação posterior na internet, no entanto, mostrou que pesquisadores já tinham identificado o sítio arqueológico há mais de duas décadas.
E comunicado às autoridades.

Algumas peças ‘ajuntadas’ pela reportagem para serem fotografadas

Mas o apelo pela preservação da área foi em vão: não existe nenhuma placa explicativa ou de advertência que possa coibir o saque das peças históricas.

A pesquisa
Em 1999, arqueólogos financiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc) realizaram a coleta de cerâmicas, louças e vidros na praia embaixo da Ponte Hercílio Luz.
Do levantamento surgiu o livro “Arqueologia das fortificações: perspectivas”, organizado por Fernanda Codevilla Soares, e que traz, ainda, dados arqueológicos dos demais fortes da Grande Florianópolis.

Cerâmica dos Carijó
Do material exumado, uma peça que chamou muito a atenção dos pesquisadores foi o fragmento de cerâmica indígena dos índios Carijó, da nação Tupi-Guarani.

“Sabemos que no período do contato, em 1550, o local onde está fixado o Forte era transitado pelos Carijó, como relata Hans Staden (aventureiro alemão que visitou Santa Catarina e escreveu o livro “Duas viagens ao Brasil”).
Isto sugere que este fragmento seja de uma base de contato entre indígenas e colonizadores europeus”, aponta a obra.

Outro material predominante na amostra é a louça branca com decoração impressa, pintada a mão ou mista.

Também fragmentos de pratos, tigelas e xícaras com motivos orientais (do Japão e China), com um repertório muito diverso de técnicas decorativas.

Como está hoje?
Atualmente, as peças históricas continuam a aflorar na linha de praia do Forte Santana em razão da ação erosiva provocada pela mudança da dinâmica das correntes dentro do canal, que altera as marés, conforme explicam os especialistas da Fapesc.

Na visita feita por esta reportagem é possível ver inúmeros objetos parecidos aos catalogados pelos arqueólogos.
São pedaços de cerâmica, similares aos indígenas, e fragmentos de louças antigas.

Uma delas é da marca brasileira “Adelinas, de São Caetano do Sul” (fábrica que funcionou entre 1929 e 1947).
A empresa foi mencionada, há duas décadas, na obra da Fapesc.

Peças estrangeiras
Entre as peças catalogadas pelos pesquisadores catarinenses, a marca estrangeira mais encontrada foi a inglesa J. & G. Meakin (1851), fabricada na China.
Outras marcas brasileiras também estão presentes como as catarinenses Schmidt, de Pomerode, e Santa Terezinha, de São Bento do Sul.

No levantamento feito em 1999, também foram encontrados fragmentos de grés, provavelmente de garrafas, sendo um destes de origem holandesa, e um braço e uma perna de bonequinhas de porcelana.

A grande variedade de objetos coletados corresponde há décadas de utilização do forte e a um padrão de consumo bem variado, de louças mais caras a tipos mais populares.

Imagem da década de 1960 mostra o forte e seu entorno invadido por moradias populares antes da reforma de 1975 (Acervo Casa da Memória)

Onde se encontram os objetos?
O material recolhido pela Fapesc foi armazenado no Museu Professor Oswaldo Rodrigues Cabral, na Universidade Federal de Santa Catarina.

Uma pequena coleção de referência do sítio também encontra-se no Laboratório de Documentação e Arqueologia da Universidade do Recôncavo da Bahia.

Ministério Público e Iphan
De acordo com a publicação, a ameaça de continuidade da erosão no Forte Sant’Anna e as sucessivas intervenções urbanas sem pesquisa arqueológica suscitou um grupo de historiadores e arqueólogos a elaborarem, em julho de 1999, um documento que foi entregue para a Procuradoria da República em Santa Catarina e para a 11ª Superintendência Regional do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

O forte no início do século 20, antes da construção da Ponte Hercílio Luz (Acervo Casa da Memória)

Neste ofício são relatadas as constantes destruições e mutilações de sítios arqueológicos presentes no perímetro urbano de Florianópolis.

De acordo com a documentação do Ministério Público, a representação ofertada por Fabiana Comerlato e outros foi ratificada ao arquivamento em 2002.

O que diz o Iphan
O Floripa Centro questionou o Iphan sobre possíveis ações para preservar o sítio arqueológico.
Segue a resposta de Maria Eduarda da Rosa, do Apoio Administrativo do Gabinete da presidência do Iphan:
Os trabalhos de arqueologia usualmente são feitos previamente a intervenções em solo, o que está acontecendo no Forte Santana. No momento não há previsão de expansão das intervenções para a área externa do Forte e assim não há projeto para recolhimento de possível material na parte externa do Forte. De toda forma, nossos arqueólogos farão vistoria no local para aferir se trata-se material arqueológico e sendo, o mesmo será recolhido”.

(As fotos atuais são de Billy Culleton)

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