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Há 40 anos – Chamada a cobrar foi inventada em Florianópolis, mas criador ainda aguarda os royalties

Quem nasceu neste século nem sabe o que é isso!
Mas as demais gerações guardam um afeto especial pela chamada a cobrar, apesar de o ato envolver uma pequena dose de constrangimento.
A frase ‘após o sinal diga seu nome e a cidade de onde está falando’ marcou todos os brasileiros a partir de 1980, quando o florianopolitano Adenor Martins de Araújo facilitou a comunicação telefônica.

Funcionário da antiga Telesc, que tinha a sede no Centro da Capital (na frente da Praça Pereira Oliveira), ele se empenhou na invenção após a filha de 11 anos ficar sem dinheiro para voltar para casa e não conseguir ligar para os pais.

Em 1980, Adenor é homenageado pelo governador Jorge Bornhausen; o ministro das Comunicações, Haroldo Corrêa de Mattos; o presidente da Telebrás, José de Alencastro e Silva, e o presidente da Telesc, Douglas de Mesquita (Foto: Arquivo pessoal/Divulgação)

Sistema implantado em 1980
“Toda invenção nasce de uma necessidade. Após o episódio com minha filha, comecei a buscar uma solução em casa. Mas o único lugar em que eu podia testar meu invento era na Telesc. Então, escrevi uma carta para provar o modelo em campo. Eles acabaram aceitando e, em 1980, o sistema foi implantado em Santa Catarina e depois em todo o país”, explicou Adenor, à reportagem do G1, em 2013, lembrando que a primeira cidade a usar o sistema foi Blumenau.

“A primeira mensagem era mais longa e quem gravou foi um locutor da antiga rádio Santa Catarina. A gravação durava 12 segundos. Depois passamos para seis, mas o teor continuava o mesmo. Atualmente, está em quatro segundos”.

Adenor Araújo em imagem da Agência Gaúcha de invenções

STJ reconhece o invento
Adenor obteve a patente da invenção em 1984, porém, no ano seguinte a Telebrás conseguiu anular o registro.
Em 1988, ele recorreu à Justiça para reaver a patente. Em primeira instância, um laudo verificou o caráter de novidade do sistema Discagem Direta a Cobrar.

Após décadas de idas e vindas judiciais, em 2013 o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu o florianopolitano como o criador da chamada a cobrar.

Como está o processo hoje
Com a decisão judicial favorável, Adenor começou a contagem regressiva para receber a indenização (royalties) pela utilização do sistema pelas companhias telefônicas.
Mas até agora, nenhum valor foi definido.

Adenor está prestes a completar 80 anos e prefere não falar sobre o assunto.
O filho Adenor Martins de Araújo Júnior informou à reportagem do Floripa Centro que o processo está no Tribunal de Justiça de Santa Catarina aguardando as movimentações finais para oficializar a indenização.

Antes, tudo passava pela telefonista
Até 1980, a ligação a cobrar existia, mas era preciso a intermediação de uma telefonista.
“A pessoa ligava para o serviço 107 e a telefonista perguntava o serviço e o destino, depois tentava o contato com o destinatário. Quando conseguia, passava todos os dados e valores e o destino precisava aceitar pagar por aquela ligação. Só então os colocava em contato”, afirmou Adenor Júnior, ao G1.

Sistema ainda existe!
Embora poucos usem, a Discagem Direta a Cobrar ainda pode ser utilizada, tanto nos últimos orelhões que resistem nas ruas da cidade, quanto nos celulares.
É só colocar 9090 antes do número do destino, ouvir a famosa musiquinha (‘tarã, tararã, tararã’!) e aguardar que o ‘abastado’ do outro lado da linha aceite o pedido do ‘necessitado’…

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Palhaço, reviravolta e vingança – Como foi a primeira eleição direta para prefeito da Capital, em 1954

Dormi prefeito e acordei palhaço”.
A frase do radialista Manoel de Menezes é a principal lembrança popular do pleito que elegeu pelo voto direto o primeiro prefeito de Florianópolis, Osmar Cunha, em 3 de outubro de 1954.
Apostando na fama como jornalista de rádio e nos seus textos ásperos do jornal A Verdade, o pai do colunista Cacau Menezes estava convencido de que venceria a eleição com relativa facilidade.

Concorrendo pelo Partido Trabalhista Nacional (PTN), o mesmo de Jânio Quadros, sustentava a sua confiança no desgaste dos concorrentes, que pertenciam aos partidos tradicionais, UDN e PSD.
Também usava uma forma de comunicação muito similar a Jânio, que fazia grande sucesso entre os eleitores.

Charge do Jornal A Verdade faz campanha para Manoel e seu pai, Menezes Filho, candidato a deputado

Após a votação, eleitores e amigos se reuniram na sua casa, onde o cumprimentaram pela brilhante vitória.
Conhecidos ligaram durante toda a noite, felicitando-o.
Menezes ensaiou até a distribuição de cargos.

Mas na manhã seguinte, foi cedo ao local da apuração, o Tribunal de Justiça.
Ao perceber que estava perdendo, saiu imediatamente em direção à redação do jornal e estampou a seguinte manchete: “Dormi prefeito e acordei palhaço!”.

Menezes na frente da rádio, com grupo de apoiadores (Acervo pessoal Maria Cláudia Menezes)

Vencedor recebeu 9,4 mil votos
Ao final da apuração, Osmar Cunha (PSD) foi eleito com 9.413 votos; João José de Souza Cabral (UDN), ficou em segundo, com 6.782, e Menezes alcançou apenas o terceiro lugar, com 3.593, enquanto o coronel Lopes Vieira (PSP), recebeu 993 votos.
Na época, a Capital tinha cerca de 70 mil habitantes.
Osmar Cunha governou Florianópolis entre 15 de novembro de 1954 e 21 de janeiro de 1959, se transformando no primeiro a ser eleito por votação direta, já que desde o tempo do Império, os prefeitos das capitais eram indicados pelo governador do Estado.

Para vingar a morte de Getúlio
A eleição ocorreu cinco semanas após o traumático suicídio do presidente Getúlio Vargas, em 24 de agosto.
O primeiro lance do pleito catarinense foi a atribuição da responsabilidade pela morte de Getúlio. Na disputa pelo apoio do PTB, considerado fundamental naquela conjuntura, PSD e UDN trocavam constantes acusações.

Tanto que um dos motes de campanha seria: “vote no PSD, para vingar a morte de Getúlio Vargas”.
E, pelo resultado das urnas, o falecido presidente acabou ajudando na primeira eleição direta para prefeito de Florianópolis.

(As informações desta reportagem constam na tese de doutorado em História “Marmiteiros, agitadores e subversivos: política e participação popular em Florianópolis, 1945-1964”, de Camilo Araújo, da Universidade Estadual de Campinas, de 2013. A foto de abertura é do acervo do jornalista Carlos Damião e mostra Manoel de Menezes e Souza Miranda no programa Mesa Quadrada, na TV Cultura, na década de 1970)

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Novo espaço cultural no Centro apresenta a história da Catedral Metropolitana de Florianópolis

Uma das primeiras iniciativas de Francisco Dias Velho após fundar a Póvoa de Nossa Senhora do Desterro, em 1673, foi construir uma pequena capela, de pedra e cal em homenagem à mãe de Jesus.
Exatamente um século depois, em 1773, foi concluída a nova edificação, que atualmente abriga a Catedral Metropolitana de Florianópolis.

A construção foi iniciada em 1753, após o governador da Capital, José da Silva Paes, escrever ao Rei de Portugal, pedindo licença para a construção de uma nova Matriz, da qual ele, engenheiro militar, foi o autor do projeto arquitetônico.
Diversas reformas ao longo dos séculos alteraram o estilo original, mas a arquitetura da portada continua a mesma.

Imagem de 1920, antes da reforma que modificou a fachada (Acervo IHGSC)

Espaço Museal
Os detalhes destes acontecimentos poderão ser verificados no novo Espaço Museal da Catedral, que será aberto ao público em dezembro.

O local escolhido para apresentar os mais de 300 anos de história fica no prédio anexo ao templo, onde até o ano passado funcionava o Café Sorrentino, no calçadão da Padre Miguelino, frente à Câmara de Vereadores.

Vista do interior do Espaço Museal, ainda em obras

O Espaço Museal foi criado em 2012 e estava exposto na sacristia da igreja.

Agora, a intenção do pároco David Coelho é permitir que mais pessoas possam conhecer a história da Catedral, que se confunde com os primórdios da cidade.
A exposição será de painéis com imagens e fotos antigas da Catedral, acompanhadas de textos explicativos.

Curiosidades da Catedral
– Em 25 de novembro de 1922, festa de Santa Catarina, a catedral foi presenteada com cinco sinos vindos da Alemanha, encomendados por Dom Joaquim Domingues de Oliveira.
– Ao todo, são sete sinos: os dois mais antigos (de 1872 e 1896) foram presentes do Imperador Dom Pedro II. Quando instalados, formavam o maior conjunto de sinos da América Latina, pesando mais de cinco toneladas.

– Os vitrais foram produzidos em São Paulo e inaugurados em 1949.
– Entre o acervo de arte sacra, encontra-se a escultura Fuga para o Egito, talhada em madeira em tamanho natural, pelo artista tirolês Ferdinand Demetz e que está na Catedral desde 1902.

– Toda catedral tem uma cátedra, a cadeira usada pelo arcebispo. A de Florianópolis foi doada pelo primeiro bispo de Montevidéu, Dom Jacinto Vera, que nasceu num navio ancorado em terras catarinenses, em 1813, e foi batizado na catedral da antiga Desterro. Ao morrer, em 1881, deixou expresso o desejo de doar sua cadeira à igreja onde foi batizado.

(Fontes: sites UFSC e Setur. A imagem de abertura é atribuída à expedição da Comissão Científica do Pacífico, provavelmente captada por Rafael Castro y Ordóñez, entre 1862 e 1864. Ela faz parte do acervo digital CSIC, subsidiado pelo governo espanhol.).

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Há 250 anos – Primeira sede da Câmara de Vereadores da Capital foi construída com imposto sobre a cachaça

Por Billy Culleton
Em 1º de novembro de 1770 começou a construção do Paço Municipal, na frente da Praça XV de Novembro.
Os recursos foram arrecadados a partir da criação de um imposto específico para esse fim: 20 mil réis para cada pipa de cachaça de 500 litros que entrasse ou saísse dos arredores da região central da cidade.

Desterro, 1785 (Pintura de Gaspard Duché-de-Vancy)

Desde 1758, o legislativo municipal já ocupava o terreno onde seria construída a nova sede, na esquina das atuais ruas Tiradentes e Praça XV de Novembro.
Na época, segundo informações do site da Câmara de Vereadores, eram cinco pequenas casas, “localizadas no Largo da Matriz, esquina com a Rua Menino Deus, posteriormente chamada Rua da Cadeia”.
Eram construções baixas, de pau a pique, barreadas e muito frágeis, sobre um terreno alagadiço.

Prédio em 1867 (Gravura de Joseph Brüggemann)

As precárias condições das edificações obrigaram as autoridades a pensar na construção de uma sede nova e definitiva.
Assim, foi criado o imposto de 20.000 réis para cada pipa de cachaça que entrasse ou saísse dos arredores, chamado de Subsídio Literário, para se obter fundos que revertessem na construção do Paço Municipal. Em 1° de novembro de 1770, o ouvidor São Paio, em carta dirigida à Câmara, coloca a licitação da obra em prática“, informa a página web do legislativo.

A construção foi finalizada em 1780 e desde então, até 2005, sediou o poder legislativo municipal de Florianópolis.

Década de 1950 (acervo Casa da Memória)

Cadeia
O prédio histórico, um dos três mais antigos da Capital (junto com a Catedral Metropolitana e o Palácio de Governo), também abrigou a cadeia pública, que funcionava no piso inferior, enquanto que, no superior, funcionava a “Assembleia Legislativa Provincial”.
Em 1930, com a inauguração da Penitenciária Estadual no Bairro Agronômica, a cadeia foi desativada.

Década de 1960 (acervo Casa da Memória)

Naquele ano, a Câmara de Vereadores foi transferida para a sede atual, na Rua Anita Garibaldi, pela necessidade de reunir num único local todos os setores da administração do Legislativo, até então separados, em virtude do exíguo espaço do prédio histórico.

Imagem de Sérgio Rubim

Museu de Florianópolis
Após a desocupação, o prédio da antiga Casa de Câmara e Cadeia passou a abrigar alguns eventos temporários, nos quais foi transformada, por exemplo, em Casa do Carnaval e Casa do Papai Noel.
Entre 2009 e 2019, a edificação secular passou por uma grande reforma que custou em torno de R$ 5 milhões, para sediar o futuro Museu de Florianópolis.

Prédio pronto para receber museu (Divulgação PMF)

Concluída a reforma do novo prédio
O atual prédio da Câmara, ao lado da Catedral Metropolitana, passou por uma reforma que custou R$ 662 mil e foi concluída neste mês de outubro.

A Casa do Povo teve fachada completamente revitalizada

É que em fevereiro de 2019, a edificação enfrentou problemas com infiltrações no telhado, que causaram alagamentos nos gabinetes dos vereadores.
A reforma do telhado do prédio foi a primeira ação estrutural realizada desde a mudança e serviu de alerta para uma recuperação da fachada.
Além da necessidade de recuperação da parte visual, pelo desgaste do tempo, a Defesa Civil produziu um laudo sobre a situação externa do prédio e alertou para o risco de queda de partes da estrutura externa que precisava de manutenção.
Agora, com a obra concluída o edifício, que serviu de prédio administrativo e agência do antigo Besc, volta a exibir toda a sua bela arquitetura moderna.

Na parte externa do prédio há dois painéis: um lembrando a resistência à ditadura militar e outro homenageando as tradições da cidade.

(A imagem de abertura é do acervo da Casa da Memória. As fotos atuais são de Billy Culleton)

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1930 e 2020 – Mesmo dia, mesma hora: as coincidências na deposição de dois governadores catarinenses

Na madrugada de 24 de outubro, à 1h, o governador eleito democraticamente pouco tempo antes, com esmagadora maioria dos votos, foi obrigado a se afastar do cargo.

A narrativa se encaixa perfeitamente nos episódios que afastaram Fúlvio Aducci, em 1930, e Carlos Moisés, em 2020.

Coincidentemente, os mandatos de ambos são os mais curtos da história de Santa Catarina, entre os governadores eleitos: Aducci, 30 dias, e Moisés, 22 meses.

Civil x Militares
Mas, há nove décadas, o motivo da deposição foi a ‘Revolução’ promovida por um militar (Getúlio Vargas) contra um civil.
Surpreendentemente, nesta última sexta-feira, foi o contrário: os civis dos poderes Legislativo e Judiciário afastaram um militar.

A casualidade deste dia histórico foi lembrada pelo jornalista Carlos Damião, em matéria divulgada neste sábado: “Outro governador catarinense foi deposto num 24 de outubro, há exatos 90 anos”.

Trincheira na Ponte Hercílio Luz
A partir da dica do mestre Damião, o Floripa Centro foi atrás dos jornais da época para verificar os detalhes da queda de Fúlvio Aducci, que tinha sido eleito com esmagadora votação meses antes e assumido a ‘presidência’ de Santa Catarina em 29 de setembro de 1930.

Na noite de 23 de outubro, para tentar repelir as forças revolucionárias que chegavam a Florianópolis, Aducci mandou arrancar parte do piso da Ponte Hercílio Luz para construir trincheiras, com arame farpado, na parte insular da obra.

Governador Fulvio Aducci

Mas a mobilização das tropas leais não foi suficiente.
Convicto de que a situação era irreversível, o governo tomou a decisão de abandonar a Capital.
Diante disso, foi hasteada, na cabeceira da ponte, uma bandeira branca, dando vários disparos para o ar”, registra o Jornal O Estado, acrescentando que, imediatamente, foram recolocados os pranchões na Ponte e, do lado do Continente, vieram os golpistas, a quem foi declarada a capitulação.
Era 1 hora da madrugada”, relata o jornal, que justifica e apoia o golpe de Getúlio.
Jornal legalista é atacado
No primeiro dia da nova gestão, outro jornal, a Folha Nova, foi atacado por populares que apoiavam o novo governo.
Grande multidão partiu da Praça Quinze rumo à rua Deodoro, gritando: A Folha Nova!”, descreve O Estado.
Os populares, entre gritos de ‘Abaixo o pasquim’ e ‘Fóra o galego’, começaram a emborcar os caixotins, a derrubar prateleiras, a quebrar os móveis e a destruir as máchinas”.
E continua: “O jornal em seus últimos números havia usado de linguagem julgada injuriosa pelos idealistas da Revolução”.
E esse foi o início da gestão de Ptolomeu de Assis Brasil, interventor nomeado pelo governo federal, que terminou em 26 de outubro de 1932, apenas dois anos após a posse.
Seria outra coincidência?

Confira aqui a íntegra da reportagem do Jornal O Estado de 25 de outubro de 1930, sobre os episódios do dia anterior.

(A imagem de abertura é da Casa da Memória)

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Em Florianópolis – Primeira rua calçada de Santa Catarina completa 175 anos

Na manhã de 21 de outubro de 1845, uma multidão se congregou na beira do mar da atual Santo Antônio de Lisboa para receber o imperador Dom Pedro II, a imperatriz Teresa Cristina e toda a comitiva.
Os soberanos chegaram no navio Vapor Imperatriz e desembarcaram às 11h30min “entre Vivas enthusiastas da população”, como foi descrito no Jornal O Relator Catharinense, criado especialmente para noticiar a visita de Dom Pedro à Grande Florianópolis.

Caminhando em direção à igreja matriz, passaram por uma pequena via de 50 metros, coberta com pedras rústicas, mas alinhadas, construída especialmente para receber os soberanos.
Nesse momento, estava inaugurada a primeira rua calçada do Estado.

Local recebe uma feira de artesanato nos finais de semana (Google Street)

Enquanto se encaminhavam para o templo para assistir ao Te Deum (musicalização de salmos), a cortejo era saudado pelo “povo de todas as condições, tomado da mais viva alegria por ver entre elle os seus Soberanos”, contou O Relator.
O casal imperial ficou poucas horas no distrito “comquanto o tempo ameaçasse chuva, e o vento fosse desabrido”.
Por isso, saíram rapidamente em direção a São Miguel, em Biguaçu, para depois retornar ao Centro de Desterro.
Dom Pedro II ficou quase um mês conhecendo a atual Grande Florianópolis e visitou Desterro, São José, Santo Amaro da Imperatriz e Águas Mornas.

Casal imperial na época da visita a Desterro (Ilustração de 1843, de autor desconhecido)

Por que em Santo Antônio?
A construção da rua calçada era uma forma de demonstrar status.
Na época, a “Freguesia de Nossa Senhora das Necessidades da Praia Comprida” tinha grande importância política, econômica e estratégica e exercia influência em boa parte da porção Norte da Ilha.
A região se destacava por um comércio intenso, junto com a produção agrícola.

Casarão do Imperador, ao lado da via calçada (Google Street)

Segundo a pesquisadora Giselli Ventura de Jesus, toda essa influência e status que tinha a freguesia refletiam a vontade que a localidade tinha de se tornar mais importante que o distrito principal (o Centro de Desterro).
Ela é autora da dissertação de mestrado “Dinâmica socioespacial do Distrito de Santo Antônio de Lisboa: passado e presente”, do Curso de Geografia da UFSC.
“O ar de modernidade dado pela primeira rua calçada, como a construção do casarão do Imperador (um dos melhores prédios da época), reflete a preocupação que a freguesia tinha para se tornar o polo central de economia da Ilha”, escreveu.

Placas na praça, ao lado da via, contam a história da freguesia

“O fato de a freguesia exercer forte influência por apresentar um número considerado de pequenos produtores e comerciantes, os quais tinham seus armazéns com os mais diversificados produtos, tornou a área estratégica, pois servia para o abastecimento de navios e de escoamento dos produtos de outras localidades para a região, ou mesmo para o Centro, além da vantagem de ter um porto na Ponta do Sambaqui.”

(A imagem de abertura mostra a Freguesia de Santo Antonio em pintura atribuída ao francês Jean-Baptiste Debret, 1768-1848)

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Há 177 anos – O passeio de Dom Pedro II e Teresa Cristina pelas ruas do Centro de Desterro

Em outubro de 1845, o casal imperial visitou a capital de Santa Catarina.
Dom Pedro II, junto com Teresa Cristina, queria conhecer de perto o interior do Brasil e passou quase um mês na atual Grande Florianópolis, entre Desterro, São José, Santo Amaro da Imperatriz e Águas Mornas.
Ao chegar à Capital, uma multidão recebeu a comitiva no Trapiche, próximo à Praça XV de Novembro.
Essa parte da história é conhecida pela maioria dos florianopolitanos.

Mas o Floripa Centro resgata o detalhamento dos passeios feitos pelo casal nas ruas do Centro, entre os dias 15 e 19 de outubro.
A narrativa é do consagrado jornalista Celso Martins (falecido em 2018) e foi publicada na Revista Mural, de Marcos César, em 2010, baseado no jornal “O Relator Catarinense”, que foi criado na época apenas para divulgar a visita imperial.

Confira:
Acompanhe o roteiro, com imagens atuais do Google Street. Na legenda, a descrição a partir das informações de “O Relator Catarinense”.


Saindo do Palácio…

iniciaram pela rua Tenente Silveira (‘do Governador’)…

depois a rua Deodoro (‘do Ouvidor’)…

chegando então à esquina da principal rua da cidade, a Felipe Schmidt (‘do Senado’)…

continuaram pela rua Deodoro (‘do Ouvidor’)…

O passeio prosseguiu pela rua Conselheiro Mafra (‘do Príncipe’)…

Rua Conselheiro Mafra (‘do Príncipe’)…

até a Praça XV (‘Barão de Laguna’)…

Rua João Pinto (‘Augusta’)…

Rua João Pinto (‘Augusta’)…

Atual Bulcão Vianna (não existia na época)…

Bulcão Vianna (não existia na época)…

Atual Mauro Ramos (não existia na época)…

chegando até a rua do Menino Deus…

O passeio incluiu o Campo do Manejo, área militar onde foi erguido o Instituto Estadual de Educação…

Atual Anita Garibaldi (não existia na época)…

Atual Hercílio Luz (não existia na época)…

Retornando pela rua Fernando Machado (‘do Vigário’)…

Rua Fernando Machado (‘do Vigário’)…

Durante todo o passeio, o Imperador e a Imperatriz, foram “acompanhados de uma multidão de pessoas de todas as classes”, recebendo vivas permanentes das pessoas nas janelas e flores…

“À noite, a cidade ficou iluminada – “acenderam-se todos os arcos e colunas” e todas as casas “se iluminaram à profia”, junto com o “esplêndido luar”…

Além disso, “Inúmeras girândolas subiram ao ar desde que anoiteceu” e, junto ao arco do comércio, “diversos fogos de vistas se atacaram”, e tocou a banda da fragata Constituição.

A cavalo
No dia 16, após suspender uma visita à Lagoa por causa das chuvas, D. Pedro e D. Teresa Cristina visitaram a Alfândega, o Armazém de Marinha, as obras da Casa para arrecadação de artigos bélicos, a Tesouraria da Província, a Provedoria da Fazenda, e a Tipografia Provincial, todos na área central.
Na Provedoria da Fazenda quis saber detalhes da receita e os impostos cobrados. Na Tipografia, “entreteve-se por algum tempo em ver compor, e imprimir”. Depois voltou ao Palácio.
Às 17 horas, “com uma das senhoras da sua comitiva”, e autoridades, D. Pedro II deu um passeio a cavalo pela rua Esteves Júnior (do Passeio), seguindo pela Praia de Fora até a estrada de acesso à Trindade (Detrás do Morro). Dali, alcançou o Saco dos Limões, “regressando num escaler” para o Centro da cidade.

Passeio noturno
À noite do domingo, 19, os imperadores deram uma banda a pé, percorrendo “todas as iluminações da praça”.
Seguindo pela rua Conselheiro Mafra (do Príncipe), foram ver a iluminação que o cidadão Antônio Luiz Cabral “fez erigir na frente da casa de sua residência, e que, como as outras, tem sido acessas desde o dia da chegada de SS. MM.
Em todas as iluminações”, o casal foi recebido por “numerosas mirândolas, e acompanhados sempre de uma imensa multidão de povo em continuas saudações de Vivas!”

Praia de Fora
Na tarde do dia 25, SS. MM. II e comitiva deram um passeio até a Praia de Fora (região das ruas Almirante Lamego e Bocaiúva), passando pela Igreja São Francisco e o Teatro Particular Catarinense.

Teatro
No dia 26, deu um “esplêndido jantar”.
À noite, foi ao Teatro Catarinense, dirigido pelo capitão José Caetano Cardoso, que ao lado dos membros da diretoria, preparou o local para a visita.
Um coro de senhoras antecedeu a comédia “O Avaro”, seguido do “Entremez – Ensaio de uma tragédia”. Os intervalos foram “preenchidos por lindas peças de músicas”.
Como na ida, foram conduzidos em alas de sócios com tochas acessas.
A presença de oficiais dos vasos de guerra estrangeiros, “tornou a companhia a mais luzida possível”.

Agenda cheia
No sábado, dia 1º de novembro, às 17 horas, D. Pedro II visitou os navios de guerra no porto e “mandando aportar a galeota à praia da Arataca, visitou também o forte de Santana, situado na extremidade do morro denominado Rita Maria”.

No domingo, dia 2, o Conde de Irajá celebrou na Catedral o Santo Sacrifício da Missa, e fez a entrega das Primeiras Ordens a cinco estudantes de Gramática Latina, filhos de João Lino da Silva – Bartholomeu Álvaro da Silva, Francisco Duarte Silva, Domingos Luiz do Livramento e Duarte Teixeira da Silva. Depois, houve beija-mão de despedida no palácio.

Dia 6, depois do jantar, o Imperador foi ao forte de Santa Cruz, onde estava ancorada a frota imperial, retornando às 21 horas.
No dia seguinte, visitou a Escola Pública de Primeiras Letras e o Hospital Militar, “onde lhe saiu ao encontro, quase curado, o marinheiro do patacho Argos, que sofreu a amputação do braço pelo tiro da salva no dia 20 de outubro, a quem SS. MM. mandou dar 100 mil réis, assim como abonar continuadamente os seus vencimentos no estabelecimento de inválidos da Corte”.

(A imagem de abertura é da chegada do casal imperial, obra do artista Vicente Pietro, que acompanhou a comitiva. A maior parte do texto é de Celso Martins, de brilhante trajetória pela imprensa de Santa Catarina, criador do site Sambaqui Na Rede)

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Outubro de 1924 – Ciente de que morreria logo, governador Hercílio Luz construiu uma miniatura da Ponte, no Centro

Por Billy Culleton

Fragilizado pelo câncer, a personalidade mais importante de Santa Catarina mandou construir uma réplica da Ponte, que posteriormente levaria seu nome, com 18 metros de comprimento, para ser inaugurada simbolicamente em 8 de outubro de 1924.

Com esse gesto, o governador Hercílio Luz deixava claro para a população local que sua saúde não resistiria (de fato, faleceu 12 dias depois, em 20 de outubro, aos 64 anos).

Na Praça Fernando Machado (Acervo do Velho Bruxo)

(Observação: esta reportagem foi atualizada com novos dados em 12/10/20. Na versão anterior, sugeria-se que Hercílio Luz teria participado da inauguração, o que nunca foi confirmado.)

Ciente de que não tinha tempo hábil para ver a sua mais relevante obra finalizada, a solução adotada foi organizar uma solenidade ao lado da miniatura, 50 vezes menor que a original.
O local escolhido foi a Praça Fernando Machado, ao lado da Praça XV e do trapiche municipal (Miramar).

Imagem do acervo da Casa da Memória

Antes, ele tinha viajado para a França, onde se submeteu a um longo tratamento para combater a doença, mas que não deu resultado.

Retorno no dia marcado
Hercílio conseguiu chegar em Florianópolis, desde a França, no dia marcado para a inauguração simbólica (8 de outubro) e uma multidão o aguardava na praça.
Vindo do Rio de Janeiro, ele desembarcou no trapiche Rita Maria (a um quilômetro do local do evento), como informa o Jornal O Estado, de 9 de outubro de 1924.

Mas o cansaço pela viagem e o grave estado de saúde o impediram de ir até a Praça Fernando Machado e ele se dirigiu diretamente a sua residência, perto da Avenida Mauro Ramos, próximo ao atual Beiramar Shopping.
Ele faleceu sem nunca mais ter visto a réplica da obra, que ficou alguns dias exposta na praça e depois foi desmontada.

A morte de Hercílio Luz ocorreu menos de dois anos antes da inauguração da Ponte, que aconteceu em 13 de maio de 1926.

Importância da obra
Os avanços civilizatórios da época tornavam insustentável a falta de uma ligação entre a Ilha ao Continente.
Era uma necessidade urgente para a cidade, já que o isolamento não combinava com uma capital de Estado.
Era preciso facilitar a chegada das pessoas e produtos até a Ilha, o que até então era feito por meio de lanchas motorizadas, canoas a vela, botes ou baleeiras, que sofriam também por conta do forte vento, conta o jornalista Paulo Clóvis Schmitz, em reportagem publicada no jornal Notícias do Dia, em 2014.

Apesar do câncer no estômago, Luz fazia questão de fiscalizar a obra pessoalmente (Imagem de autoria desconhecida)

Segundo Schmitz, o gado era trazido a nado em direção ao Forte Santana, para ser abatido em diferentes pontos fora do Centro.
Engenheiro civil, formado na Bélgica, Hercílio Luz colocou a construção da ponte na plataforma de governo do seu terceiro mandato como governador.
“Hercílio Luz buscou recursos junto a bancos norte-americanos para erguer a ponte de ferro na Capital. O contrato foi assinado em 27 de setembro de 1920, mas houve atrasos nos repasses dos recursos e a obra só ficou pronta em 1926, sob a responsabilidade dos engenheiros norte-americanos David B. Steinman e Holton D. Robinson”, escreveu Schmitz.

Nota fiscal da American Bridge (Reprodução de documentário da SCC)

E assim nasceu o cartão postal de Santa Catarina, nunca visto finalizado pelo seu idealizador, que teve que se contentar em inaugurar um pequena réplica no meio da praça.
Mesmo assim, Hercílio Luz ficou eternizado na memória dos catarinenses, representado pelo monumento ao lado da obra, onde estão enterrados os seus restos mortais.

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Bairro da Figueira, no Centro – O território negro, ao lado do antigo porto, onde nasceu o Figueirense

Por Billy Culleton
Desde o século 18, e até a década de 1940, a região Oeste do Centro de Florianópolis era ocupada por famílias pobres, majoritariamente, de ascendência africana.

Era o popular Bairro da Figueira, uma área retangular que se estendia paralela à orla do mar: desde o Mercado Público Municipal até quase a cabeceira insular da Ponte Hercílio Luz, tendo como limite a Rua Felipe Schmidt – ou seja, a largura de três ruas.As vulneráveis e insalubres moradias dividiam o território com estaleiros, armazéns e trapiches, além de comércios e hotéis.
No bairro, tudo girava em torno do porto, localizado ao lado.
Por isso, também existiam inúmeras casas de prostituição, frequentadas, principalmente, por marinheiros.

Acervo de Conrado Goeldner

Alheias à má-fama do bairro, famílias carentes ali se estabeleceram formando um núcleo de trabalhadores do mar e de mão de obra para desempenhar diferentes afazeres, necessários ao cotidiano da cidade, segundo mostra a pesquisa do professor Paulino de Jesus Francisco Cardoso, do Departamento de História da Udesc.
Ele é o autor da obra “Cidadania e expectativas no bairro da Figueira: o surgimento do Figueirense Foot-Ball Club”, publicada em 2016.

Nasce o clube do povo
Foi nesse contexto que, em 1921, comerciantes e outras figuras conhecidas do bairro idealizaram a criação do Figueirense Foot-Ball Club, um dos clubes mais populares de Santa Catarina.
A ‘turma’ costumava se reunir na barbearia de Jorge Albino Ramos, no início da Rua Padre Roma, para conversas e aspirações sobre futebol.
Depois de meses de planejamento, um grupo liderado pelo próprio Jorge Ramos e também composto por Trajano Margarida, João Savas Siridakis, Domingos Joaquim Veloso e Ulisses Carlos Tolentino, agendou para 12 de junho de 1921, o encontro decisivo para a fundação da agremiação esportiva.
Foi Tolentino quem cedeu a sua residência que ficava “ali próximo da barbearia, exatamente na rua Padre Roma, número 27, para fazer a tão anunciada reunião”, como informa a pesquisa do professor Cardoso.

Imagem é do acervo da Udesc

Siridakis, mais conhecido como Janga, defendeu a ideia de que o clube deveria chamar-se Figueirense e contou com o apoio dos demais participantes do encontro.
Escolheu o nome em razão da figueira existente na zona do cais Rita Maria, origem da denominação do bairro.

E a figueira?
A árvore original cresceu num morro existente atrás do atual Posto Rita Maria, que já foi uma pedreira, e onde agora existem dois grandes edifícios residenciais.
A figueira ficava 150 metros acima do local da fundação do clube, na Rua Padre Roma, 27.

Hoje, existem algumas árvores que trazem a lembrança da flora original do bairro.
Um delas se encontra no Parque da Luz, a 200 metros da figueira original.
Confira a imagem:

Não é uma figueira, só uma lembrança, pelo formato

Qual era a Rua da Figueira?
No bairro também existia a Rua da Figueira, que consta em documentos de 1876.
Mais tarde chamou-se Fraternidade, depois Cais Igualdade, para se transformar na atual Francisco Tolentino (homenagem ao jornalista e deputado, nascido em São José, e que morreu em 1904).

Como localizamos o antigo Nº 27 da Rua Padre Roma?
O Nº 27 da Padre Roma aparece na pesquisa do professor da Udesc Paulino Cardoso.
A rua começa na frente da Rodoviária.
Após o Posto Rita Maria, tem um estacionamento e, na sequência, a tradicional Serralheria Cardoso, que funciona há mais de meio século.
Os funcionários deste comércio, que hoje tem o número 86, informaram ao Floripa Centro que antigamente ali era o número 17.

Serralheria Cardoso tinha o número 17

Quando mostramos a foto da residência de Ulisses Tolentino, onde foi a fundação do Figueirense e que consta no site do clube, os trabalhadores da loja foram unânimes em afirmar:
“Era ali na frente, onde agora tem aquela loja de celulares. Era a casa de uma senhora e que foi derrubada faz uns 25 anos. Ela tinha um filho, meio deficiente, que ficava sempre olhando o movimento nessa janela que aparece na foto”.

Casa de Ulisses Tolentino (acervo Figueirense)

Atualmente, a loja de celulares é o Nº 119 da Padre Roma.

E o Bairro da Figueira?

O bairro, local de marcante presença africana e de seus descendentes, extinguiu-se como território negro nos anos de 1940, quando a cidade estava sendo transformada numa capital que deveria seguir ‘os rumos do progresso’, segundo as aspirações das elites locais.
De acordo com a obra “Cidadania e expectativas no bairro da Figueira...”, a região central passara a ser espaço da administração pública, dos comércios estabelecidos e da prestação de serviços.

Bairro da Figueira, em foto sem data confirmada. À direita, aparece o depósito André Wendhausen, cuja fachada ainda existe, na frente do Posto Rita Maria

Assim, as classes populares tiveram que reconstruir suas vidas nas regiões periféricas da cidade, nos contornos dos morros ou em áreas mais afastadas do perímetro central.

Área cheirava a alcatrão
O pesquisador da Udesc Paulino Cardoso traça o perfil dos moradores do bairro.
“Aquela pequena região, com centenas de marinheiros, praças da Marinha de Guerra, estivadores e tantos outros populares, sugeria um cenário espantoso para as elites do período, visto agrupar muitos populares de origem africana”, escreve ele.

“Soldados, marinheiros, estivadores, criados, policiais, calafates, carpinteiros, vadios de todas as ordens pareciam adorar aquele bairro à beira-mar, que segundo Virgílio Várzea, cheirava a alcatrão”.

Tais personagens constituíam, segundo Cardoso, grupos sem vínculo com as elites locais, sendo que “soldados de diferentes corpos militares, imperiais marinheiros, homens do mar de todo o tipo, estivadores e outros trabalhadores urbanos viviam a protagonizar inúmeras rusgas nas áreas centrais da cidade”.

“Muitas populações de origem africana destas regiões mais pobres, além de seus labores cotidianos, passaram a ver no clube de futebol nascido no bairro da Figueira, uma opção positiva para uma região tão malvista pelas elites dirigentes. Alinhava-se uma identificação com um time que surgira naquela área e fora organizado por homens das fainas do mar, dos trabalhos nas ruas, nas barbearias, dos sonhos em comum”, diz o texto do pesquisador da Udesc.

—- Confira, aqui, mais sobre a história do Figueirense

(A imagem de abertura é acervo da Casa da Memória)

Histórias inéditas da Florianópolis antiga – 1800-1900_reduce2

 

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Vídeo recuperado – Travessia da Ponte Hercílio Luz na década de 1980, com fundo musical de Luiz Henrique Rosa

Um vídeo da década de 1980 mostra que, após a interdição em 1982, pedestres, ciclistas, motociclistas e carroceiros continuaram a utilizar a Ponte Hercílio Luz até 1991, quando foi interditada completamente.

Um vídeo que está circulando nas redes sociais mostra a população aproveitando a Velha Senhora.
As imagens contam com o fundo musical de Luiz Henrique Rosa cantando “Ponte Hercílio Luz” que, anos depois, também foi interpretada por Martinho da Vila.

Quem foi Luiz Henrique Rosa:
Luiz Henrique Rosa nasceu em Tubarão em 25 de novembro de 1938 e foi um grande compositor brasileiro de bossa nova e MPB.

Aos 11 anos mudou-se com a família para a Capital, lugar que homenageou até as últimas canções.
Aos vinte e poucos anos teve um programa na Rádio Diário da Manhã, onde tocava suas próprias composições e os sucessos da época.
Antes de compor as estimadas 200 canções, Luiz Henrique também tocou em festas, bares e bailes.

Em 1960 excursionou por todo o Sul brasileiro a convite do pianista gaúcho Norberto Baldauf, acompanhando seu conjunto melódico.

Em 1961 mudou-se para o Rio de Janeiro, onde se apresentou em diversos night-clubs e onde também gravou seu primeiro disco.
Um compacto com duas músicas, Garota da Rua da Praia e Se o Amor É Isso, composições em parceria com Cláudio Alvim Barbosa, o Zininho.
No Beco das Garrafas teve a oportunidade única de tocar ao lado de Elis Regina. Surgindo no templo da bossa nova, despontou com um balanço diferente, ao lado de nada menos que Jorge Ben, além da cantora iniciante Flora Purim, em 1963.
Ao lado de feras como Os Cariocas, Tamba Trio de Luiz Eça, Bossa Rio, Copa Trio e as iniciantes Quarteto em Cy que se apresentavam nas Boates Bottles Bar, Little Club e Bacharat, disputava as canjas das tardes domingueiras ao lado de músicos como Sérgio Mendes.
Em 1964, quando gravou seu primeiro LP, A Bossa Moderna de Luiz Henrique, conquistou as paradas de sucesso em todo o país, tendo arranjadores J.T.Meirelles e Dom Salvador Filho.

Em 1965, no auge da bossa nova no Brasil, Luiz Henrique partiu para os Estados Unidos.
Em Nova York, conviveu com grandes músicos norte-americanos, como Stan Getz, Oscar Brown Jr., Billy Butterfield, Bobby Hacket e Liza Minnelli, entre outros.
E com muitos brasileiros, como Sivuca, Hermeto Pascoal, Walter Wanderley, João Gilbertoe Airton Moreira.
O músico permaneceu nos Estados Unidos até 1971, quando então voltou à sua amada ilha.
Em 1976 lançou seu último LP, Mestiço.

Morreu aos 46 anos, em 1985, quando completaria 25 anos de carreira, vítima de um acidente automobilístico.

Em 2003 foi organizado, em sua homenagem, o CD ‘A Bossa Sempre Nova de Luiz Henrique’, para o qual os músicos Martinho da Vila, Elza Soares, Ivan Lins, Luiz Melodia, Sandra de Sá, Biá Krieger e Toni Garrido foram convidados a interpretar e gravar suas composições.

Em 2009, Liza Minnelli lançou a coletânea ‘Liza A&M the complete A&M Recordings’, com grandes sucessos de sua carreira, e incluiu três canções de Luiz Henrique Rosa, gravadas originalmente pelos dois na década de 1960.

(O vídeo é de autoria desconhecida. Se alguém souber o autor, favor, fazer contato com o Floripa Centro, que dará os créditos correspondentes. Informações sobre Luiz Henrique Rosa obtidos na Wikipedia)

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Hospedou o presidente Médici – Prédio do melhor hotel da Capital, na década de 1970, sediará órgão municipal

Por Billy Culleton
Com localização privilegiada na região central de Florianópolis, luxuoso e com a frente voltada para o mar da Baía Sul, o Hotel Royal era o preferido de autoridades e artistas que visitavam a cidade.
Inaugurado em 1º de janeiro de 1960, o estabelecimento (na Rua Osmar Rigueira, entre as ruas João Pinto e Antônio Luz) contava com 100 quartos, sendo 20 deles com banheiro privativo, um diferencial, na época.

Todas as unidades habitacionais tiveram desde o início, geladeira e televisão. “Foi o primeiro hotel da cidade a utilizar suporte de televisão, quando ainda nem existia para vender”, contou o proprietário-fundador Mário Rigueira à pesquisadora Fabíola Martins dos Santos.
Ela escreveu a dissertação de mestrado “Uma análise histórico-espacial do setor hoteleiro no núcleo urbano central de Florianópolis (SC)”, aprovada pela Universidade do Vale do Itajaí, em 2005, na Pós-Graduação em Turismo e Hotelaria.

Foto do livro ‘Florianópolis: uma viagem no tempo (2004)’, de Beto Abreu

Em 1971, o hotel foi totalmente reservado para atender o presidente Emílio Médici, e toda a sua comitiva, que visitou a Capital durante dois dias.
Artistas de renome nacional, como Fernanda Montenegro e Fernando Torres, também se hospedavam ali e adoravam curtir o famoso piano-bar, no estilo Art Déco.

Alagamento e decadência
Na época era o mais luxuoso hotel da cidade, geralmente com 100% da ocupação, chegando a hospedar 36 mil pessoas por ano.
Porém, em meados da década de 1970 começam a aparecer outros hotéis na cidade e a vista é ofuscada pela construção do aterro da Baía Sul, que afastou o mar do hotel.
A partir de 1980 passou a sentir drasticamente a queda na ocupação, que alcançou 19% naquele ano.

Postal da década de 1960, publicada por Carlos Damião, no ND, em 2015

Outro fator importante para a decadência, de acordo com Fabíola dos Santos, foi a construção do Terminal Urbano Cidade de Florianópolis, em 1986, quando o edifício foi praticamente encoberto.
Ainda ocorreu o fechamento da Rua Antônio Luz, que dava acesso ao estacionamento do hotel.
Em 24 e 25 de dezembro de 1995, o empreendimento foi atingido pela grande enchente, tendo o porão e a área térrea totalmente inundados e teve que fechar durante 20 dias.
O proprietário encerrou as atividades do hotel em 2005 para transformá-lo num prédio com salas comerciais, mas desde 2015 o edifício está sem uso.
Revitalização
O prédio está sendo totalmente recuperado pelo proprietário para receber as instalações da Secretaria Municipal de Finanças.
A iniciativa faz parte da revitalização da região Leste do Centro promovida por várias entidades, com o apoio da prefeitura, que também abrirá o novo Pró-Cidadão (e Procon) em edificação ao lado do antigo Hotel Royal.
No contrato de cinco anos, foi combinado um aluguel mensal de R$ 40 mil. A prefeitura informa que, atualmente, o órgão municipal paga R$ 89 mil por mês no prédio da Rua Arcipreste Paiva, próximo à Catedral.

(Foto de abertura de autoria desconhecida. As fotos atuais são de Billy Culleton)

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Vídeo – A implosão, em 1990, do icônico Hotel La Porta, no Centro, que hospedou o comunista Luís Carlos Prestes

Por Billy Culleton
Na ensolarada manhã do domingo 5 de agosto de 1990, exatamente às 9h09min e diante de milhares de florianopolitanos, Amaury Norberto Silva acionou o botão que fez desaparecer uma parte da história da cidade.
O prédio construído em 1932, uma referência da arquitetura na Capital, abrigou o charmoso Hotel La Porta durante três décadas.
O mesmo Amaury que detonou os explosivos para implodir a edificação, passou parte de sua infância brincando no hotel.
É que a sua avó, Lídia Souza Silva, foi gerente do estabelecimento por 20 anos e o levava para se juntar a Nelson, filho do proprietário Miguel La Porta.
“Aquela cena da implosão foi muito triste, porque além de ser um símbolo da cidade, eu tinha uma profunda relação sentimental com o local”, afirma o coronel aposentado da Polícia Militar, hoje com 87 anos, e que na época era o diretor de Defesa Civil do município.

Amaury Silva apertou o botão do detonador (Imagem: arquivo pessoal)

Primeiro elevador da cidade
Com três andares, além do térreo, o La Porta era o melhor hotel da cidade e contava com um famoso piano-bar.
Estava localizado na frente da Praça Fernando Machado, na esquina da Rua Conselheiro Mafra, onde atualmente existe uma agência da Caixa Econômica Federal.
O prédio foi o primeiro a ter elevadores na Capital.

Década de 1950 (Acervo: UFSC)

Comunista ‘na área’
O charmoso estabelecimento era frequentado por artistas, músicos e viajantes endinheirados.
Mas a presença do mais emblemático comunista da história do país era, até hoje, desconhecida da grande maioria dos florianopolitanos.
“Luís Carlos Prestes se hospedava no hotel clandestinamente para se reunir com os membros do Partido Comunista do Estado. Ele ficava, no máximo, um dia”, conta Amaury, sobre as reuniões que aconteciam secretamente num dos quartos do estabelecimento, na década de 1950.

Luís Carlos Prestes, frequentador secreto (Acervo PCB)

Decadência
Na década de 1960, o prédio foi comprado pela Caixa Econômica Federal, que instalou uma agência.
O banco construiu mais dois andares, em cima dos três originais, e descaracterizou completamente toda a fachada.
Após três décadas, com infiltrações e problemas estruturais insolúveis, a Caixa decidiu implodir o prédio.
Uma nova agência só foi inaugurada em 2013.

Primeira implosão na Capital
Como diretor da Defesa Civil, o coronel Amaury Norberto Silva, que é pai de Beto Barreiros (Box 32), acompanhou todo o processo anterior à implosão, executada por uma empresa de Curitiba.
No dia marcado, uma multidão chegou no Centro para ver a primeira implosão da história da cidade.
De manhã cedo, dinamite foi colocada em cada um dos pilares do prédio.
Para a detonação, um único cabo foi estendido por cerca de 100 metros, até o outro lado da Praça Fernando Machado, próximo ao atual Terminal Cidade de Florianópolis.
Desde ali, Amaury pressionou o botão para implodir o prédio.
“Quando contar três, aperta!”, foi a ordem recebida do engenheiro da empresa.
“O prefeito Antônio Bulcão Vianna queria apertar o dispositivo. Mas, o engenheiro responsável disse que deveria ser eu, por ser o diretor da Defesa Civil. E, também, por ter acompanhado todo o processo”.

5 de agosto de 1990, 9h09min (Imagem de Julio Cavalheiro)

Em dois segundos, tudo veio abaixo, conforme o planejamento.
“O único problema foi que a caixa d’água do prédio não foi bem amarrada e acabou atingindo a lateral de uma loja vizinha, na Conselheiro Mafra. Mas a Caixa pagou o estrago, depois”, lembra Amaury, que mora na Capital.

Implosão foi 124 anos depois da explosão
No mesmo lugar, estava localizada a edificação da primeira alfândega de Florianópolis, que explodiu misteriosamente em 1866, conforme divulgou o Floripa Centro, na semana passada.

Pintura de Aldo Beck

Anos depois, a mesma área foi ocupada pela firma André Wendhausen Importação e Exportação até que o carioca Miguel La Porta comprou o terreno para construir o icônico hotel no Centro da Capital, que teve um final melancólico.

Firma Wendhausen ocupou o terreno do Hotel La Porta (autor desconhecido)

Hotel similar em Porto Alegre
Já o outro hotel construído pela família La Porta, em Porto Alegre, na mesma época e com o mesmo nome, ainda continua ‘em pé’.
O prédio fica no Centro da cidade, na esquina da Rua dos Andradas e Rua Uruguai, e atualmente é a sede da Faculdade do Desenvolvimento do Rio Grande do Sul (Fadergs).

Hotel La Porta no Centro de Porto Alegre (Imagem de Jorge Silva)

Confira o vídeo da implosão, resumido, dois minutos:

Confira o vídeo da implosão, completo, oito minutos:

Veja outras imagens do Hotel La Porta:

Cartão postal da década de 1960 (autor desconhecido)
Anúncio no Jornal O Estado, década de 1940
Acervo IBGE
Imagem de autor desconhecido
Jornalista Manoel de Menezes (pai do Cacau) dirigindo seu Buick vermelho, com Garrincha sentado ao seu lado. Também aparece a placa da Varig, que tinha um agência no prédio do hotel.
Imagem do site Cerrado Ilha
Imagem do acervo do Velho Bruxo

(A foto de abertura é do acervo do Velho Bruxo. O vídeo é de autoria desconhecida)

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