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1919 – Multidão vai ao delírio, na Praça XV, ao ver um avião pela primeira vez sobrevoando Florianópolis

Um fato inédito mobilizou milhares de pessoas às 12h35min da terça-feira 16 de setembro de 1919, no Centro de Florianópolis.
Um interessante aparelho” passou sobre a Praça XV, fazendo “dificilíssimas manobras”, como publicou o jornal local República.
A reportagem acrescenta que o piloto “foi delirantemente aplaudido pelo povo, que vivou enthusiasticamente o grande aviador”.

A pequena aeronave militar de um único lugar era pilotada pelo italiano Antonio Locatelli, que tentava a façanha de voar de Buenos Aires até o Rio de Janeiro.

Locatelli partindo de Buenos Aires, em 1919 (Acervo e pesquisa Silvio Adriani Cardoso)

Tratava-se de um avião modelo Ansaldo S.V.A-5, utilizado para reconhecimento e bombardeio na Primeira Guerra Mundial.
Era famoso pela velocidade e pelos voos de longo alcance.

Durante o percurso fez escalas em Montevidéu e Porto Alegre, onde foi recebido como herói.

Após decolar da capital gaúcha na manhã de 16 de setembro, o piloto deveria chegar ao aeroporto de Santos, no final da tarde.

Jornal anuncia a passagem do primeiro avião (Acervo Biblioteca Pública do Estado)

Ao meio-dia, quando passou por Florianópolis, uma multidão se concentrava nas imediações da praça central, já que a notícia tinha sido amplamente divulgada pela imprensa.
Ao perceber a aglomeração, Locatelli iniciou a descida do aparelho e realizou algumas evoluções.

O povo, “levado às raias do delírio”, aplaudiu atônito e fixou nas retinas o fato de ter visto pela primeira vez aquele ‘aeróstato’ sobrevoando a cidade.

O aviador italiano a bordo da aeronave militar (Acervo e pesquisa Silvio Adriani Cardoso)

Acidente em Tijucas
O insólito raide, no entanto, quase terminou em tragédia.
Uma hora depois de passar pela capital catarinense, o motor do aparelho começou a apresentar problemas.

Locatelli decidiu retornar a Florianópolis, para a planície da Ressacada, que tinha assinalado em seu mapa como o mais próximo campo de pouso alternativo.

Aeronave capotada em Tijucas (Reprodução do site da Amab, acervo Carlos Eduardo Porto)

Ao passar por Tijucas, porém, o aeroplano estava perdendo a força e o italiano decidiu aterrissar num terreno sem vegetação.
Só percebeu que se tratava de um pântano quando as rodas do aeroplano estavam prestes a tocar o solo. Não houve tempo para mais nada.
O avião capotou e o piloto foi violentamente catapultado para fora da cabine.

Apesar da gravidade do acidente e do grande susto, Locatelli sofreu apenas escoriações leves. Mas era o fim do raide, o avião não poderia ser reparado rapidamente.

Jornal de 17 de setembro de 1919 (Acervo Biblioteca Pública do Estado)

Após pegar seus pertences na aeronave, o piloto foi conduzido a cavalo para o centro de Tijucas, onde foi recebido pelas autoridades locais.
Mas ele insistiu em ir até Florianópolis.

Tão logo soube da queda do avião, o governador mandou seus representantes para prestar socorro.
À noite, o carro oficial com Locatelli chegou ao Estreito, desde onde uma embarcação o levou ao Trapiche Municipal, no Centro da Capital.

Lá, uma multidão formada por cidadãos de todas as classes sociais o acolheu entusiasticamente.

Homenagens no Palácio
Mais tarde, o piloto, usando uniforme do Exército italiano e com o peito ornado de medalhas, dirigiu-se ao Palácio do Governo, onde foi recebido no salão nobre pelo próprio governador, entre outras autoridades, além de representantes da imprensa.

Na ocasião, após uma breve palestra sobre a sua experiência, Locatelli explicou que precisava seguir imediatamente para a Itália, onde pretendia fazer parte do raide Roma-Tóquio.
Para isso, embarcaria em Florianópolis no paquete Max, da Empresa de Navegação Hoepcke, rumo a Santos.

No dia 17, pela manhã, Locatelli, após calorosas despedidas no Trapiche Rita Maria, recebeu de um grupo de senhoritas um ramalhete de flores naturais e embarcou para sua próxima aventura.

O avião avariado, após idas e vindas, foi cedido ao Aeroclube Brasileiro, em 1920.

(Esta matéria foi produzida com base numa ampla reportagem escrita pelo florianopolitano Silvio Adriani Cardoso e publicada no site da Associação da Memória Aeropostale Brasileira (Amab). O autor autorizou a publicação deste conteúdo).

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Pânico e mortes no golpe de estado – A mais sangrenta batalha da história de Florianópolis, no Centro, em 1893

Às 2h da madrugada de 31 de julho de 1893 a Praça XV de Novembro foi tomada por 130 homens a cavalo, armados com espingardas e pistolas.

Comandados por Hercílio Luz atacaram o Palácio de Governo, atual Cruz e Sousa, para destituir o então governador Eliseu Guilherme, no contexto da Revolução Federalista.

A guarda do governador iniciou a resistência, disposta a barrar os revoltosos.
Dois canhões trazidos às pressas da Fortaleza Santana, na atual Beira Mar Norte, foram usados para tentar amedrontar os invasores.

A cidade foi tomada pelo medo, com pessoas feridas no entorno da sede do governo.

O maior pânico manifestou-se nas casas das famílias que residem ao lado do Palácio, que foram completamente varejadas pelas balas”, publicou o jornal Cidade do Rio, em 1º de agosto de 1893.

Dezenas de tiros de carabina, de todos os lados, romperam as vidraças e marcaram as paredes do Palácio.

Pessoas foram feridas mortalmente dentro da sede do governo, nas ruas do entorno e na Praça XV, entre eles, militares, civis e médicos.

Os mortos foram os civis Manoel Berlinck da Silva e João Fonseca Povoas e o soldado da Força Pública José Gomes.
Foi a única vez que morreu alguém no Palácio por um conflito armado.

Logo pela manhã, Eliseu Guilherme foi obrigado a desocupar o prédio e se abrigar na Capitania dos Portos, atual Museu da Marinha, na Avenida Hercílio Luz.

No mesmo dia, Hercílio Luz fez sua entrada triunfal no Palácio.

Mas não durou muito tempo e logo foi convencido a devolver o poder a Eliseu Guilherme.

Em 1894, ele voltou ao comando do Estado, por meio de eleições.

Entre suas primeiras ações, esteve a reforma do Palácio, que passou a ter a suntuosa aparência dos dias atuais.

Confira o vídeo produzido pela Fundação Catarinense de Cultura:

(A foto de abertura, de 1905, é da Casa da Memória. As demais imagens são da Fundação Catarinense de Cultura, de onde foi extraída a maioria das informações desta reportagem)

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A redescoberta do Parque da Luz – De cemitério municipal a uma área verde privilegiada no Centro da Capital

Por Billy Culleton

Durante 70 anos ficou abandonado.
Antes disso, até 1925, no local funcionou o cemitério municipal de Florianópolis, por outras oito décadas.
Mas foi nos últimos anos que o atual Parque da Luz, uma área de 37 mil metros quadrados (quase 4 hectares ou a mesma quantidade de campos de futebol), foi descoberto pela maioria da população da Capital, impulsionado pela reabertura da Ponte Hercílio Luz.

Conheça a luta pelo parque
Na década de 1990 quando os primeiros edifícios começaram a ser construídos nos altos da Rua Felipe Schmidt, os novos moradores ‘descobriram’ o local e, em 1997, criaram a Associação dos Amigos do Parque da Luz, que buscava lutar pela preservação do espaço, até então ignorado pelas autoridades municipais.
Na época, a área começou a ser cobiçada pelas construtoras e também pelo poder público, que cogitava construir ali a sede da prefeitura.

Mas a mobilização da comunidade e de ecologistas da cidade conseguiu reunir 10 mil assinaturas, o que abriu o caminho para que a Câmara de Vereadores, em 1998, transformasse o espaço em Área Verde de Lazer, garantindo a sua preservação.

Boicote do poder público
A conquista não trouxe o apoio que se esperava das autoridades municipais, que, ‘magoadas’ com a derrota, boicotaram qualquer ajuda oficial.
A saída, então, foi juntar forças e recursos próprios dos moradores para manter o parque.

Dezenas de vizinhos começaram a doar, por meio da conta da Celesc, pequenos valores mensais, suficientes para pagar um único funcionário, ‘Seu Dário’.
Atualmente, a Associação continua como principal responsável pelo Parque e ainda é mantida pela colaboração voluntária de seus associados.
Foi Dário que durante duas décadas trabalhou sozinho, cuidando, roçando e podando as árvores, que foram sendo plantadas voluntariamente, sem nenhuma orientação, pela população. Em 2020, Dário voltou para sua cidade de origem, no Oeste catarinense.

Atualmente, são cerca de 5 mil exemplares, de todos os tipos, que cresceram nos últimos 20 anos, já que antes era um terreno baldio, sem nenhuma vegetação.

Mito e preconceito
O Parque foi sendo ocupado gradualmente para atividades de lazer, principalmente, pelos moradores do entorno e também por esporádicos eventos musicais e exposições.

Porém, o preconceito do restante da população florianopolitana com relação à área foi se acentuando: “um local abandonado e inseguro, frequentado por moradores de rua e dependentes de droga”.

Essa descrição injusta, parcial e que denotava desconhecimento, foi reforçada pelos meios de comunicação, com frequentes reportagens superficiais e sem dados, já que houve pouquíssimos registros de crimes no Parque da Luz.
Você se lembra de algum? Não? Este jornalista que mora na frente desta área há mais de duas décadas, também não!

Redescoberta
Nos últimos anos, as administrações municipais começaram a dar um pouco mais de atenção ao local.
Foi instalada a sede da Floram numa construção que era ocupada irregularmente por uma costureira por 20 anos. Funcionários da Floram, agora, colaboram com a manutenção do local.
Só em maio de 2019 foi inaugurado o sistema de iluminação.

Mas, agora, finalmente, o Parque é de todos!
Graças à reabertura da Ponte Hercílio Luz a população tem invadido a área e a prefeitura feito algumas melhorias.
Adultos e crianças de todas as classes sociais brincam alegremente, correm, pulam e sobem nas árvores.

De uma hora para outra descobriram a única área ainda verde do Centro, com fácil acesso e onde é possível desfrutar do canto dos milhares de pássaros que ali têm seu lar.
Um muito obrigado a todos os que, desde 1995, lutaram para garantir este espaço que, agora, está sendo redescoberto pelos florianopolitanos.

Confira a galeria com imagens da população desfrutando do parque:

Retrospecto histórico
No século 19, o atual Parque da Luz era chamado Colina da Vista Alegre ou o Morro do Barro Vermelho.
Em 1840, a área foi destinada para a instalação do cemitério municipal.
O ‘campo santo’ era considerado ‘afastado’ do Centro e ficava no topo do morro (que era mais alto do que na atualidade, já que foi rebaixado duas vezes).

Em 1925, um ano antes da inauguração da Ponte Hercílio Luz, o necrotério foi transferido para o Itacorubi, levando a maior parte dos 30 mil corpos ali sepultados.
Nas décadas seguintes, estudantes de Medicina e Odontologia ainda frequentavam o local buscando ossos para seus estudos.

Pode estar aí a justificativa pelo abandono e negligência do poder público por quase um século: o temor dos fantasmas ilhéus que rondavam o local, mas que hoje aproveitam a felicidade dos conterrâneos que frequentam o parque e já não assustam mais ninguém.

Confira a galeria com as fotos da evolução do Parque da Luz ao longo dos último anos:

Crédito das imagens: as fotos antigas são do acervo do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina.
As fotos mais atuais são de Billy Culleton.

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Prédio da Alfândega desapareceu – A terrível explosão, ao lado do cais, que estremeceu o Centro de Desterro em 1866

Por Billy Culleton
Às sete horas da manhã de 24 de abril de 1866, parte dos 12 mil habitantes de Desterro acordou sobressaltada por uma apavorante explosão no Centro da cidade.
Em poucos segundos, o belo prédio da Alfândega ficou em ruínas e pedaços da construção foram espalhados num raio de 300 metros..
A edificação ficava na esquina do “Largo do Palácio com a Rua do Príncipe” (hoje, Arcipreste Paiva com Conselheiro Mafra), na frente da Praça Fernando Machado, ao lado da Praça XV.
No local, atualmente existe a “Agência Zininho” da Caixa Econômica Federal, onde antes estava o Hotel La Porta.

Jornal local fala em ‘desastre horrível’

No texto em que divulga a notícia, o jornal “O Despertador”, de 27 de abril de 1866, começa descrevendo a cena rotineira de uma manhã normal no Centro da cidade:
“Muitos indivíduos sahião de suas casas e se dirigião ao mercado. As canôas de diferentes lugares se aproximavão daquele ponto com os seus generos, como é de costume, e os colonos alemães desembarcarão dos seus botes os seus produtos agrícolas, e collocavão no largo entre a alfandega e casa do mercado, onde já havia compradores”.
Na sequência, detalha o desastre:
“Serião 7 horas, horrível explosão, originada, por certo, de matéria inflammável existente na mesma alfândega, fez abbater todo o edifício até os alicerces, levando pelos ares grande parte do tecto, indo cahir a grande distancia”.
E continua:
“A detonação foi tal que fez estremecer os edifícios mesmo os mais distantes da praça; muitas vidraças ficarão inutilisadas.
O incêndio manifestou-se immediatamente, e os sinos das igrejas davão signal delle!!”

Ilustração de Joseph Brüggemann, 1867, mostra Largo do Palácio (reprodução livro “Desterro: Ilha de Santa Catarina”, de Gilberto Gerlach)

Segundo o jornal, o povo ‘sobressaltado’ correu até o lugar do sinistro e em menos de cinco minutos havia mais de mil pessoas no local.
A explosão também danificou parcialmente o antigo Mercado Público, que ficava na frente, onde hoje está a Praça Fernando Machado.
Na época, a Alfândega possuía seu próprio atracadouro no cais, ao lado do trapiche, que depois foi o Miramar.

Mortos e feridos
O Despertador lista os nomes dos mortos e feridos.
“De tão terrível catastrophe resultou a morte de dez pessoas; tres gravemente feridas e doze levemente, cujos nomes abaixo mencionamos.”
Entre as vítimas, portugueses, alemães e brasileiros. Também há menção aos escravos, identificados apenas pelo primeiro nome.Barcos ajudam a apagar fogo
Uma só bomba e esta em máu estado sahio da capitanaia do porto e com ella se começou o trabalho para dominar o incêndio, o que não se conseguiria se não acudissem as bombas dos vapores Brazil e Gerente que se achavão no porto (…). A não ser isto graves prejuízos sofreria o commercio visto a proximidade de muitas casas de negócio”, descreve o jornal.

Mapa de Desterro em 1868 mostra o local da Alfândega (4), o trapiche (5) e o mercado público (9). Arquivo Litografia do Instituto Philomático (reprodução do livro “Florianópolis, memória urbana”, de Eliane da Veiga)

História do prédio
A criação da primeira Casa da Alfândega, também conhecida como Casa de Arrecadação da Marinha, em Desterro, teve lugar em 1778, segundo conta o historiador Carlos Humberto Corrêa, no livro “História de Florianópolis Ilustrada”.
O autor faz referência a um documento do Ouvidor Moniz Barreto, dirigido à Câmara Municipal, em 23 de junho daquele ano:
“Tenho tirado, em resulta das minhas observações, a minuta da inclusa representação para Sua Majestade sobre a criação de uma Alfândega no porto desta Ilha. As vantagens, que daqui resultam me parecem demonstradas.”
Somente em 1876, dez anos depois da explosão, foi inaugurado o novo prédio da alfândega, que existe até hoje, próximo ao Mercado Público Municipal.

Confira vídeo sobre o tema, produzido pela Fundação Catarinense de Cultura:

MATÉRIAS RELACIONADAS
Dez fotos desde 1890 – A evolução do prédio da Casa da Alfândega

(As fontes para esta reportagem foram os livros “Florianópolis, memória urbana”, de Eliane Veras da Veiga, e “História de Florianópolis Ilustrada”, de Carlos Humberto Corrêa. A imagem de abertura é uma pintura de Aldo Beck, publicada no livro de Eliane da Veiga)

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Culpa do ‘vento súli’ – O dia em que o Zeppelin passou por Florianópolis, mas ninguém viu

Às 7h da manhã do dia 28 de junho de 1934 o dirigível Graf Zeppelin passava pela costa oriental da Capital, com destino a Buenos Aires.
Havia semanas que a população florianopolitana aguardava ansiosamente para ver passar o enorme ‘balão’ de 237 metros de comprimento, que precedeu ao atual transporte aéreo.

Como parte da propaganda nazista, os responsáveis pelo bólido alemão faziam questão de se exibir, em voos demonstrativos a 40 metros de altura em cima das cidades, para espanto dos moradores que viam a gigantesca aeronave flutuar silenciosamente sobre as suas casas.
Foi assim nas grandes capitais como Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre.

Zeppelin no Recife, 1934 (reprodução do site Airway)

Florianópolis também estava na rota para mostrar a conquista do espaço aéreo pelos germânicos.
Há 86 anos, em 25 de junho de 1934, o jornal O Estado deixava claro a expectativa local com a passagem do dirigível:

‘O ‘Graf Zeppelin’ para nós que nunca vimos nenhum dirigível, é no momento o grande attractivo.
Se as condições atmosféricas e a organização técnica do dirigível o permitam, ele fará evoluções sobre as principais cidades do litoral sul do Brasil para satisfazer a curiosidade que domina a todos.
E Florianópolis, certamente, será contemplada com essa visita do gigante dos ares.
No Rio, nos dias da chegada do dirigível, há muita gente enthusiasta dele que desperta cedo para vê-lo passar.
É de crer que o povo de Florianópolis não mostre menos enthusiasmo pela grande aeronave que tantos louvores têm merecido da imprensa mundial’.

Tela ‘Zeppelin e o barraco do limão’, do pintor catarinense Rodrigo de Haro (Masc)

Mas quando chegou o grande dia, o nosso conhecido vento sul provocou frustração geral.
O Estado, em 29/6/1934, descreveu a decepção:

‘Baldada espera!
Alta madrugada, desencadeou-se forte vento sul, com ligeiros chuviscos. Não apareceu o “Zeppelin”.
A ‘Agência Condor’ comunicou-nos que a aeronave passou às 7 horas ao longe do costão oriental da nossa ilha.
– A ‘Agência Panair’ informou a um dos nossos redactores que seu hydro-avião, hoje chegado do sul, cruzou com o dirigível, que viaja para Buenos Aires e, naturalmente, está encontrando o forte vento que continua a soprar’.
E, assim, provavelmente enviesado pelo vento ‘súli’ (como diz o mané), o Zeppelin passou por cima da Ilha do Campeche e seguiu rumo a Buenos Aires, onde chegou no final do dia.

Na volta, sobrevoo pelo Vale do Itajaí
Em 1º de julho de 1934, no retorno da capital argentina e rumo ao Rio de Janeiro, o lendário dirigível passou por Blumenau.

Zeppelin em Blumenau, 1934 (foto de Adalberto Day)

O site Brusque Memória narra o acontecimento:
Blumenau acordou mais cedo naquele dia 1º de julho de 1934. Ainda de madrugada, milhares de pessoas, ansiosas, se posicionaram em pontos estratégicos da cidade. O motivo de tanto alvoroço surgiu imponente, no céu junto com os primeiros raios do sol. Exatamente às 6h45 min, segundo relatos da época, o ronco dos motores anunciou a chegada do LZ 127 Graf Zeppelin, uma das grandes maravilhas que a tecnologia humana havia conseguido criar até então.
Um dos símbolos mais utilizados pela Alemanha nazista para convencer o mundo de seu poderio, o lendário dirigível significava muito mais que isso para as pessoas comuns, que o admiravam, como um ícone da modernidade. A noticia de que ele passaria por Blumenau, vindo de Buenos Aires rumo ao rio de Janeiro, se espalhou rapidamente dias antes. A população preparou até bandeirinhas para recepcioná-lo e o Zeppelin não decepcionou tanto empenho. Tornaram aqueles poucos instantes inesquecíveis.”

Dirigível Graf Zeppelin sobrevoa Joinville, em 1934 (reprodução site Brusque Memória)

Dois anos mais tarde, no dia 1º dezembro de 1936, Joinville, Blumenau, Brusque, Indaial, Jaraguá do Sul e Corupá receberiam a rápida visita de outro dirigível, o Hindenburg.
Seis meses depois, a aeronave se incendiaria em pleno vôo sobre Nova Jersey, nos Estados Unidos. A tragédia iria antecipar a aposentadoria do Graf Zeppelin, que ainda passaria mais uma vez por Blumenau, em 1937, antes de fazer sua ultima viagem em 18 de novembro do mesmo ano”, conta o Brusque Memória.

Características do Zeppelin
– Comprimento: 237 metros.
– Velocidade máxima: 128 km/h.
– Autonomia de voo: 10.000 km.
– Voo inaugural: 18 de setembro de 1928.
– Duração voo Alemanha-Rio de Janeiro: três dias.

Catarinenses notáveis que voaram no Zeppelin:

Ruth Hoepcke, junto com seu marido Aderbal Ramos da Silva, retornou da lua de mel na Alemanha a bordo do Zeppelin (Acervo Instituto Carl Hoepcke)
Cônsul Carlos Renaux é servido no interior do dirigível, em 1932, voltando de uma viagem à Alemanha (reprodução site Brusque Memória)

Como era o interior do dirigível:

Trabalho manual para o pouso (reprodução do site Airway.com)
Interior do dirigível (reprodução do site Airway.com)
Cabine de comando (reprodução do site Airway.com)

Confira alguns vídeos do Zeppelin:

  • Passagem pelo Rio de Janeiro
  • Passagem por Recife
  • Acidente do Hindenburg nos Estados Unidos

    (A foto de abertura é da passagem por Joinville, em 1934, do site Brusque Memória)
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A descoberta do cisne negro, no Centro de Florianópolis – Crônica de Carlos Nogueira*

Nunca vi antes um cisne tão grande. Mesmo se ele tivesse tamanho comum, também não lembraria de ter visto, de tão perto, outro igual.
Ao contrário dos cisnes que eventualmente encontro, todos eles de cor branca, este na minha frente é negro.
Há mais uma discrepância: em vez de superfícies aquáticas, o cisne que agora observo habita em blocos de concreto.

Nos topamos sempre no mesmo lugar, durante a minha caminhada para o trabalho. Diante de sua magnitude, é difícil não o perceber.
Quem poderia ignorar um cisne negro de quase mil metros quadrados em pleno centro de Florianópolis?
Talvez alguém para quem as ruas sejam apenas obstáculos entre o local de partida e o de destino. Não é o meu caso.

Mas voltemos ao protagonista. Apesar dos encontros costumeiros, confesso que somente nesta tarde parei para observá-lo com calma.
Ele possui uma postura altiva, com as asas abertas, como se estivesse prestes a se descolar dos dois paredões em que nada.
Em um terceiro paredão, a ave está representada na forma humana, que corresponde à imagem do poeta catarinense Cruz e Sousa: o cisne negro da literatura.

Existe ainda, gravado em letras tão colossais quanto o restante, um de seus sonetos mais famosos: “Enlevo”.
Aqueles versos convidam os pedestres para uma pausa; para que também abram as asas, e voem um pouco além dos compromissos aos quais se dirigem.

A paisagem destes paredões me lembra da minha infância em Goiânia. Mais precisamente de um lago, o Lago das Rosas.
Nele, havia pedalinhos em formato de cisnes. Eram de várias cores: branco, amarelo, verde, azul, roxo. Mas nenhum deles era negro. Nenhum.

Tanto tempo depois, finalmente estou diante de um cisne negro. Me sinto um pouco como o explorador holandês que, no século dezessete, fez o primeiro registro de um exemplar.
Até então, a existência deles era desconhecida: isso foi o que li em algum lugar.
Mas eles existem sim. E, pelo que consigo perceber, são enormes.

* Escritor angolano-brasileiro,residente na Grande Florianópolis. ‘A descoberta…” faz parte do seu mais novo livro de crônicas, Deslocamentos, da Editora Penalux.

Clique AQUI para saber mais sobre o livro.

(As fotos são de Billy Culleton)

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Marco para o turismo internacional – Há três décadas Florianópolis recebia o primeiro voo regular do exterior

No domingo 6 de janeiro de 1991 Florianópolis organizou uma grande festa no Aeroporto Hercílio Luz para recepcionar o primeiro voo internacional para Santa Catarina.

Naquele dia, a Varig inaugurou a linha regular entre Florianópolis e Buenos Aires, que operaria uma vez por semana, aos domingos.
Até então, a rota entre as duas cidades só era possível por meio de voos charters.

Autoridades e comunidade observam a chegada do Boeing 737 da Varig

Os turistas argentinos foram recepcionados pelo prefeito Antônio Bulcão Viana, junto com a banda da Polícia Militar e o coral infantil do Clube 6 de Janeiro.

Na sequência, foram convidados a apreciar um coquetel com diversos quitutes e bebidas, no restaurante do aeroporto.

Imagem do Diário Catarinense mostra o prefeito Bulcão Viana observando o coral do Clube 6 de Janeiro

A recepção foi organizada pela Associação Comercial e Industrial de Florianópolis (Acif), junto com outras entidades locais ligadas ao Turismo, que apresentaram o vídeo publicitário “Cidade de Florianópolis”, produzido pela Protur.

Hermanos e high society
O Boeing 737 decolou de Buenos Aires às 12h30min com destino ao Rio de Janeiro, com escala na capital catarinense.
A maioria dos 131 passageiros era composta por ‘hermanos’, mas também havia um grupo de senhoras da alta sociedade florianopolitana, sob a liderança de Kyrana Lacerda, viúva do ex-governador Jorge Lacerda.

Recepção com coquetel e vídeo para os passageiros

Assim, há exatamente três décadas, Florianópolis entrava definitivamente na rota dos voos internacionais.

(As imagens são do acervo pessoal do jornalista Manoel Timóteo de Oliveira, que também repassou todas as informações para a produção desta reportagem)

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Inaugurada no Natal de 1861 – Conheça a pequena igreja ‘invisível’ do Centro de Florianópolis

Por Billy Culleton
Encravada no meio de enormes prédios, num recuo da Rua Conselheiro Mafra, encontra-se a Igreja Nossa Senhora do Parto.
Localizada no centro histórico da Capital, é desconhecida pela maioria da população. Muitos já passaram na frente. Porém, poucos entraram.
É um dos templos com menos história registrada da cidade: há pouquíssimas imagens antigas e nenhum livro ou trabalho acadêmico que  resgate a sua memória.

O seu início remonta a 1837 quando foi autorizada a construção da pequena igreja que abrigaria a imagem de Nossa Senhora do Parto, trazida por imigrantes portugueses.
A obra começou em 1841, na antiga Rua do Príncipe, no então Bairro da Figueira, próximo à região portuária da cidade.
Após duas décadas, a edificação foi inaugurada, em 25 de dezembro de 1861.

Arquitetura
A igreja tem uma nave única, com sacristia lateral.
A sua ornamentação é simples, destacando-se no fundo do altar, a imagem da padroeira.

Imagem da Virgem, em registro de Norma Bruno

O piso é de ladrilho hidráulico, do século 19.
Segundo pesquisa de Luiza de Souza, sob a orientação da professora da Unisul Eliane Veras da Veiga, ao longo dos anos, o templo sofreu várias modificações, que comprometeram a sua arquitetura original.

Reforma no século passado
Em 1915, foi feita a sacristia e em 1959, uma reforma, ampliou a igreja para o lado esquerdo, sendo construída a torre dos sinos, de acordo com o levantamento “Igreja Nossa Senhora do Parto: memória e atualidade”, da Unisul.

Registro da década de 1960 (Acervo Velho Bruxo)

A partir de então, influenciadas pela corrente migratória alemã em Santa Catarina, adotou elementos decorativos de igrejas ecléticas.
Externamente, é visível a alteração do estilo clássico tradicional, pois já não apresenta as características típicas das igrejas oitocentistas.

Uma década fechada
A igreja foi tombada como patrimônio histórico municipal em 1986.
Mesmo assim, ficou fechada por uma década, a partir de 1990, sendo reaberta no ano 2000, após uma grande reforma, que revitalizou a edificação.

Registro do início do século 20 (autoria desconhecida)

Naquele ano, foi criada a Comunidade de Vida Divino Oleiro, que administra as atividades na igreja até hoje.

A tradição
O Dia da Nossa Senhora do Parto, padroeira das mulheres que acabaram de se tornar mães, é comemorado em 18 de dezembro (nesta sexta-feira!).
O culto a esta Virgem é uma das mais tradicionais devoções da França, Espanha e Portugal e se espalhou por muitas outras nações.

Imagem do início da década de 1970 (Acervo Velho Bruxo)

Foram os missionários espiritanos, da França, que divulgaram o culto à Nossa Senhora do Bom Parto no mundo.
No Brasil eles aportaram em dezembro de 1885, e encontram essa devoção já estabelecida no país, segundo levantamento da Arquidiocese de São Paulo.

Os registros indicam que os cristãos brasileiros começaram a invocar Nossa Senhora do Bom Parto, no Rio de Janeiro, em 1650.

Mapa de Desterro de 1868 mostra a localização da igreja N. S do Parto (do livro Florianópolis, Memória Urbana, de Eliane da Veiga)

Serviço:
Missas: de segunda-feira a sábado, às 12h15min. Terça-feira também às 15h.
Visitação: de segunda-feira a sexta-feira, das 9h às 17h. Sábado, das 9h às 13h.
Endereço: Rua Conselheiro Mafra, 674 (entre Padre Roma e Bento Gonçalves), Centro, Florianópolis.

Crônica sobre a Igreja da Nossa Senhora do Parto, por Norma Bruno*

Descobrindo tesouros escondidos
Apesar de muito andarilhar pela cidade, confesso que só conheci a Igreja de Nossa Senhora do Parto no final do ano passado.
Não por desinteresse, muito pelo contrário. Sempre tive curiosidade de conhecê-la e me ressentia, pois imaginava que tivesse sido demolida.

Fiquei surpresa ao saber que, ao contrário de tantas outras igrejinhas espalhadas pela cidade – quem lembra de uma que havia em frente à Praça dos Bombeiros “tombada” na década de 1970? – a igreja de Nossa Senhora do Parto ainda está em pé e não só continua aberta a visitação como mantém uma intensa rotina de atividades litúrgicas.

A imagem da Senhora é uma lindeza!
Fiquei admirada com a boa conservação interna, certamente fruto da dedicação de um bando de senhorinhas que, muito faceiras com a minha visita, interromperam a reunião que faziam e se puseram a responder perguntas que eu, aliás, não havia feito (mais ilhéu impossível rsrs).
Fui convidada para as missas, os terços e as novenas. Qualquer dia eu pinto lá pra rezar um terço e relembrar meus tempos de colégio “das frera”.

Na saída, a realidade aguardava: estacionamento no pátio, o sufocamento da igrejinha pelos prédios vizinhos e a já conhecida decadência do entorno.
Deprimente.
A verdade é que precisamos conhecer nossa cidade, ocupar os espaços, falar sobre o que acontece.
E assim como devemos denunciar as barbaridades, precisamos também divulgar as boas iniciativas, a história, contar os causos e valorizar as pessoas como aquelas senhorinhas que lutam para manter vivo o pouco que sobrou de um patrimônio tão rico como o nosso.

Apesar disso e ainda que a Rua Conselheiro Mafra continue ostentando barbaridades arquitetônicas, felizmente também encontramos casinhas revitalizadas, bem pintadas, ocupadas como moradia ou por tradicionais casas de comércio, pois nem só de equipamentos culturais se faz uma revitalização.

Independentemente do aspecto religioso, a Igreja de Nossa Senhora do Parto merece uma visita.
Seja pela sua arquitetura despojada, pela beleza de suas imagens ou simplesmente pela sua permanência na paisagem.
Coisa rara em Florianópolis.
* Publicada em 23 de fevereiro de 2014

(O desenho da imagem de abertura está numa placa na entrada da igreja, assinado como Haa)

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As grades que cercavam a Praça XV há mais de um século estão pelo Centro. E você já passou por elas!

Por Billy Culleton
A Praça XV de Novembro, no Centro da Capital, esteve cercada com muros e grades de ferro por mais de duas décadas: entre 1891 e 1912.
O acesso do público era restrito, com horários controlados para visitação.

A instalação serviu como uma espécie de apartheid, buscando separar pessoas das distintas classes sociais da cidade.
“A cerca metálica protegia madames que ali conversavam e vigiavam as filhas, enquanto empregadas domésticas ouviam galanteios de operários, soldados e marinheiros junto às calçadas externas”, conta o jornalista Paulo Clóvis Schmitz, em reportagem publicada no Jornal Notícias do Dia, de 5/2/2017.
A cerca, com os gradis fundidos na Inglaterra, foi inaugurada pelo ‘presidente’ da província de Santa Catarina, Gustavo Richard, em 1891.
A retirada, em 1912, seguiu ordens do prefeito Henrique Rupp, que decidiu abrir a praça para toda a sociedade, segundo conta Adolfo Nicolich da Silva, no livro “Ruas de Florianópolis”.
História escondida, mas presente nas ruas
As grades foram reaproveitadas em três construções históricas do Centro de Florianópolis: a Maternidade Carlos Corrêa (na Avenida Hercílio Luz), o Asilo Irmão Joaquim (na Avenida Mauro Ramos) e a Igreja Nossa Senhora do Rosário (Rua Marechal Guilherme, na frente da escadaria do Rosário).

Maternidade Carlos Corrêa
Asilo Irmão Joaquim
Igreja do Rosário

Confira os detalhes:

 

Cadê os portões?
Dos quatro portões de acesso à Praça XV nunca mais se teve notícias: entre os florianopolitanos mais antigos existe a lenda de que um deles estaria na entrada do Cemitério São Francisco de Assis, no Itacorubi.
Mas a reportagem do Floripa Centro foi até o local, e o antigo portão difere daqueles que aparecem nas fotos originais da praça cercada, embora o desenho circular da parte inferior seja similar (poderia ter sido cortado na parte superior). Fica o mistério…
Os funcionários do cemitério, no entanto, negaram que a estrutura de ferro fosse da Praça XV e foram unânimes em afirmar que o atual portão principal do ‘campo-santo’, outrora, estava instalado no Mercado Público Municipal.

(As imagens antigas são do acervo da Casa da Memória. As atuais, de Billy Culleton – 12/6/2020)

 

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Histórias do Centro

Há exatos 60 anos – Avião da Esquadrilha da Fumaça que caiu no Centro da Capital atingiu casa de futuro prefeito

Apoio cultural: Box 32 e CDL de Florianópolis

Por Billy Culleton
Uma tragédia aérea comoveu Florianópolis na manhã de 28 de novembro de 1961.
Um avião da Esquadrilha da Fumaça que fazia uma apresentação para milhares de pessoas, no Centro, caiu no Largo Benjamin Constant, localizado na frente do atual Supermercado Hippo.

Piso da praça evoca tragédia com avião modelo T-6

Os quatro aviões faziam uma exibição em razão dos festejos pela entrega de espadins aos novos oficiais da Polícia Militar de Santa Catarina, no Quartel do Comando da PM, na frente da Praça dos Bombeiros.

Reportagem do Jornal O Estado de 29 de novembro

Nesse momento, durante as ‘evoluções’, houve o choque entre dois aviões.
Um deles caiu na, depois chamada popularmente, ‘Praça do Avião’, a 300 metros do Quartel, matando o piloto Durval Trindade, carioca de 27 anos.
A outra aeronave, mesmo com a asa direita danificada (perdeu 50 centímetros), conseguiu manter-se no ar e aterrissar na Base Aérea.

Registro do fotógrafo Paulo Dutra, do Jornal O Estado

O aparelho, após bater no solo, atingiu uma residência, de propriedade do General Vieira da Rosa, conhecido como General Rosinha, que se tornaria prefeito municipal entre os anos 1964 e 1966.

Aviões pararam em Florianópolis por pane em motor
No dia anterior à tragédia, a Esquadrilha da Fumaça retornava de Porto Alegre com destino ao Rio de Janeiro.
Por causa de uma pane no motor, justamente do avião que caiu depois, houve um pouso de emergência na Base Aérea de Florianópolis. Os demais aparelhos também desceram.

Aproveitando a rápida permanência dos famosos ases da aviação nesta capital, o comando da Polícia Militar do Estado convidou-os a fazer demonstrações, já que no dia de ontem vários festejos marcaram a entrega de espadins aos novos oficiais do Curso de Formação de Oficiais, mantido por aquela corporação”, publicou o Jornal O Estado, de 29 de novembro de 1961.

Imagem do Largo na década de 1970 (Acervo Casa da Memória)

E continua o relato:

“Às 9h33min, precisamente, quando executavam uma manobra denominada trevo, a fatalidade fez com que o avião do tenente Trindade se chocasse com o avião do tenente Otto, tendo o primeiro, em velocidade espantosa, caído ao solo, na parte norte do Largo Benjamin Constant”.

Foto de Paulo Dutra mostra os restos do avião

 “Atingido, o avião sinistrado, desgovernado, baixou vertiginosamente, rompendo fios de alta tensão e, batendo no solo, projetou-se contra a residência do General Vieira da Rosa derrubando uma das paredes fronteiras e indo cair nos terrenos de fundo. O aparelho ficou completamente destroçado, reduzido a um montão de ferro retorcido.”

Após a tragédia, o corpo do piloto foi levado para a Base Aérea e, antes de ser transladado para o Rio de Janeiro, recebeu homenagens do então governador Celso Ramos, que estava assistindo à apresentação da Esquadrilha da Fumaça e cuja residência familiar, coincidentemente, ficava a 100 metros do Largo Benjamin Constant, na Avenida Trompowsky.

Registro do evento no Comando da PM, antes do acidente (Jornal O Estado)

(A foto de abertura é do Arquivo Nacional)

Confira aqui outra reportagens do Floripa Centro

 

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Tinha 10 andares – Em 1959, Florianópolis inaugurava o seu primeiro “arranha-céu”

Por Billy Culleton

“A Capital está de parabéns. O soberbo edifício da Praça XV vem dar-lhe novo aspecto. Mais um marco de progresso”.
Esta descrição é o início da reportagem do jornal O Estado de 19 de setembro de 1959, data da inauguração do edifício Meridional, no Centro da Capital.

O prédio de 10 andares sediaria a “majestosa sede da filial do Banco Nacional do Comércio”, segundo a mesma matéria jornalística.

O ‘espléndido arranha-céo que tanto veio embelezar nossa velha fisionomia urbana’, foi construído onde existia um prédio comercial de dois andares do século 19, na esquina das ruas João Pinto e 15 de novembro.

Registro do antigo prédio de dois andares, à direita, em 1940

Uma das novidades foi que apenas os dois primeiros andares eram comerciais, sendo os restantes, residenciais.

Após o Banco do Comércio, várias instituições bancárias ocuparam o local: Sulbrasileiro, Simonsen, Meridional (que dá o atual nome ao edifício) e, hoje, o Santander.

Um dos moradores do edifício, Rodolfo Cerne, de 89 anos, relembra da festa de inauguração. “A cidade parou para participar do grande evento. Fui contratado para fazer as fotos do evento. Tirei menos de 10 fotografias, que nunca mais encontrei”, conta, na porta de entrada para os apartamentos, na rua João Pinto, cujo saguão ainda possui as estilosas caixas de correio de bronze.

Rodolfo Cerne (D) conversa com o porteiro Djalma Pereira, na entrada do prédio

(As imagens antigas são do acervo da Casa da Memória, as atuais de Billy Culleton. Os registros do Jornal O Estado são do acervo da Biblioteca Pública do Estado)

Confira outras fotos do edifício:

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A oito décadas da façanha – Rovere, o taxista manezinho da Praça XV que venceu o primeiro grande rally do Brasil

Por Billy Culleton
Na década de 1930, um jovem chauffeur da Praça XV se destacava entre os colegas pelas reconhecidas habilidades na condução dos ‘carros de aluguel’.
Popular e carismático, o manezinho Clemente Rovere era o mais requisitado para fazer as corridas pelas ruas de Florianópolis.
Embora sem experiência em competições de automobilismo, em 1937, foi convencido a participar do Raid Montevidéu-Rio de Janeiro, uma corrida automobilística de 3,2 mil quilômetros.
Para viabilizar a participação, o governador Nereu Ramos cedeu-lhe um automóvel Hudson Six, fabricado em 1923 e que pertencia ao Estado.

Rovere junto ao Hudson 1923

A competição, entre 4 e 11 de abril, reuniu os 45 melhores pilotos da América, oriundos do Brasil, Argentina, Uruguai e Chile.
Após uma semana, Rovere, junto com o co-piloto Raphael Linhares, surpreenderam a todos e conseguiram um heróico 5º lugar, conquistando a admiração da imprensa nacional.
O locutor oficial da corrida, Carlos Alberto Fraga, disse:

Diante do que esses dois homens estão fazendo com o carro Hudson, devemos confessar que não conhecemos automobilismo. São dois heróis!”, publicou o Jornal O Estado, de 14/4/1937.

Raid Rio de Janeiro-Porto Alegre
Apesar da fama conquistada, Rovere voltou a trabalhar como chauffeur na Praça XV e, eventualmente, participava de corridas regionais.
Em 1940, no entanto, recebeu apoio para representar Santa Catarina no primeiro rally de longa distância realizado no Brasil: o “Raid Rio de Janeiro-Porto Alegre”.
Foram 2.076 quilômetros de precários caminhos, a maioria de terra. A competição aconteceu entre 11 e 17 de novembro e contou com a participação de dezenas de pilotos brasileiros e de países vizinhos.

O manezinho correu com um Ford V8, que ele mesmo preparou, já que era aficionado por mecânica e fazia a manutenção dos próprios carros.
Elite brasileira prestigiou largada
Em 14 de novembro de 1940 foi dada a largada no Rio de Janeiro, com a presença das mais altas autoridades do mundo político, esportivo e empresarial.
A corrida teve três paradas antes de chegar a Porto Alegre: São Paulo, Curitiba e Florianópolis.
Ao final de cada etapa os corredores tinham tempo de recuperar suas máquinas e eles próprios, pois eram muito exigidos física e mentalmente.
Na manhã de 17 de novembro, os pilotos saíram de Florianópolis, acompanhados por uma multidão.
Como o campeão uruguaio Hector Sedes havia vencido a etapa Curitiba/Florianópolis, ele saiu na frente de Rovere, que ficou em segundo.
Mas o motor do carro de Sedes fundiu a poucos quilômetros de Porto Alegre, quando estava nove minutos à frente do catarinense.
Assim, Rovere fez a ultrapassagem e conseguiu vencer uma das mais famosas e importantes corridas de carro em estrada já realizada no país.
Foram poucos os carros que conseguiram suportar a dura prova até a bandeirada final
E, ao chegar à capital gaúcha, o “Ás das curvas”, como era chamado, foi carregado pelo povo, ‘vestindo’ os louros da vitória.
Apesar das chuvas e do estado de conservação das estradas, a velocidade média de Rovere, ao longo dos mais de 2 mil quilômetros, foi de 74 km/hora.

Ele ganhou também o prêmio “Estado de Santa Catarina”, destinado ao piloto que atravessasse o território catarinense no menor tempo.
Depois desta competição, não há registros de Clemente Rovere ter participado de outras competições.


Dados e curiosidades:
– Clemente Rovere, filho de imigrantes italianos, nasceu em Florianópolis em 14/11/1905, fruto da união de Antônio Rovere e de Rosa Lana Rovere.
– Casou-se em 1927 com Alzida Maria de Abreu Rovere com quem teve sete filhos.

– Ele faleceu prematuramente em 1944, aos 39 anos.
– Durante muitos anos existiu, no ponto de táxi da Praça XV, uma pequena placa indicativa, com os dizeres: “Ponto Clemente Rovere”.
– A única homenagem existente na cidade ao mais importante piloto da história de Santa Catarina é a rua que leva seu nome, na Capital, perpendicular à Avenida Mauro Ramos, próximo ao Instituto Estadual de Educação.
– Na época, os jornais faziam uma ampla cobertura diária das corridas.
Exemplo disso foi o Jornal A Gazeta, de 10/4/1937, que publicou na sua capa:
Impressionantemente
Os nossos volantes continuam empolgando, pela impressionante demonstração de arrojo e de técnica que vêm demonstrando.

Eles assinalam a pujança da raça, glorificando as tradições da terra de Anita Garibaldi.

As estações radiofônicas estrangeiras, especialmente do Uruguai e da Argentina destacam o estoicismo deles, reputando como um dos mais competentes volantes da América do Sul.

A rádio Farroupilha disse: ‘Ditosa terra que tais filhos tem‘.”


– A população da cidade acompanhava as façanhas de Rovere pelo rádio.
O povo de Florianópolis poude sentar-se ao pé de aparelhos de rádio e ouvir as notícias que de longe eram gritadas para todos os céus da América. (…) Em torno do acontecimento formou-se em Florianópolis uma electrizante torcida”, disse o Jornal O Estado, de 14/4/1937.

(As fotos históricas são do acervo pessoal de Maurício Rovere, neto de Clemente Rovere.
Já as informações desta reportagem foram pesquisadas nos sites “Clemente Rovere – Um aceno para a história”, “Histórias que vivemos”, e “Curva do S”)

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