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Em 1875 – Desterro foi a primeira cidade do Sul do país a se comunicar com o exterior por telegrama

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Por Billy Culleton
Desde um prédio na frente da Praça XV de Novembro, no Centro da então Desterro, partiu a primeira comunicação internacional em tempo real feita no Sul do Brasil.

A façanha, há 146 anos, só foi possível graças à instalação de um cabo submarino que ligava Rio de Janeiro com Buenos Aires.

No caminho, um navio inglês foi interligando as cidades de Santos, Desterro (SC), Rio Grande (RS) e Montevidéu.

Amostras dos cabos submarinos utilizados para ligar o Brasil ao mundo (Acervo do Museu da Companhia Western)

Tudo ocorreu em 1875, com diferença de algumas semanas entre uma cidade e outra, até chegar na capital argentina.
“Na medida em que o cabo ia sendo instalado, o telégrafo já ficava disponível imediatamente, possibilitando o envio de telegramas para o exterior”, explica o engenheiro Carlos Eduardo Porto, que chefiou a Embratel em Santa Catarina no início da década de 1970.
Nascido em Florianópolis há 84 anos, ele também foi diretor da Telesc por 13 anos, até 1983.

O cabo submarino para o Sul do país foi uma extensão de outro que unia o Brasil à Europa desde 1874 e que foi inaugurado por Dom Pedro II.

O serviço de telégrafo no Brasil foi concedido à Western Telegraph Company por um prazo de cem anos.

Prédio atual na Rua João Pinto (Billy Culleton)

Na capital catarinense, a empresa inglesa se instalou em 1874, na Praça XV, e em 1923 mudou-se para um prédio na esquina das ruas João Pinto com Nunes Machado, onde ficou até 1974, quando encerrou as atividades.

O prédio centenário permanece muito bem conservado e é utilizado até hoje como comércio.

Contrato por um século
A concessão do serviço de telégrafo para a Companhia Western no Brasil foi autorizada pelo imperador Dom Pedro II, por um período de cem anos.

Trabalhadores na frente do prédio da Western durante uma greve (Acervo Walter Pacheco Jr)

Assim, até 1974, a companhia era responsável pela operação e manutenção dos cabos submarinos, que transmitiam e recebiam telegramas de diversos pontos do país e do exterior.

Em Florianópolis, os telegramas eram transmitidos por Código Morse através de cabos subterrâneos e submarinos até uma subestação na Praia do Campeche, passando pela Costeira do Pirajubaé.

Telégrafo exposto no Museu Naval em Florianópolis (Billy Culleton)

Dali, as mensagens seguiam para Santos ou Rio Grande, desde onde continuavam para a América do Norte, Europa e África.

“Em Florianópolis, era comum as pessoas ficarem esperando na frente do “Cabo Submarino” – como era chamada a agência de telégrafos na Ilha – por respostas para os telegramas que haviam acabado de mandar”, nos diz o jornalista Rogério Mosimann, na dissertação de mestrado ‘Implicações da internet nos jornais e a presença da RBS na web’ pela UFSC, em 2007.

Sala da Western na Capital (Acervo Walter Pacheco Jr)

Durante mais de 70 anos, até a década de 1950, o telégrafo era o meio de comunicação mais usado pela população.

Primórdios no Brasil e SC
Em 1852 foi feita a primeira ligação telegráfica no país, entre a Quinta Imperial e o Quartel do Campo, no Rio de Janeiro.

Segundo Mosimann, a primeira linha a sair do Rio de Janeiro foi motivada pela Guerra do Paraguai (1865/1870), a fim de conectar a capital do império com Rio Grande, Pelotas e Porto Alegre.

Em Santa Catarina a conexão com a rede telegráfica começou em janeiro de 1867, através da ligação de Desterro com Laguna.

Mensagem de Dom Pedro
No Brasil, o cabo de telégrafo submarino chegou ao Rio de Janeiro no final de 1873.

O imperador e sua comitiva aguardavam na Praia de Copacabana desde onde foram transmitidos os primeiros sinais para a Bahia.

A primeira transmissão para a Europa foi feita em junho de 1874, com uma mensagem de Dom Pedro II para a Rainha Vitória e ao rei Dom Luís, de Portugal.

Conserto
“Quando sofriam avarias, os cabos submarinos eram recuperados por navios especiais e tecnicamente montados com dispositivo no casco que permitia captar sinais de telegrafia”, descreve o pesquisador Alexandre da Rocha, em ‘A era do Cabo Submarino‘.
Ao detectar o local da ruptura, os navios suspendiam o cabo com guinchos e reativavam a linha.

(Acervo Walter Pacheco Jr)

Funcionários
Segundo Rocha, até 1959, todas as chefias eram inglesas.
O catarinense Ernani Carioni, nos anos 1960, foi o primeiro profissional a exercer a função de engenheiro da agência em Florianópolis sem ser inglês.

Relógio centenário
Um dos mais importantes símbolos da Western Telegraph era o relógio que ficava na janela da sede.

A população florianopolitana costumava acertar as horas baseada no aparelho fabricado em 1911 pela Gillett & Johnston, da Inglaterra.
Ele era muito confiável porque marcava as horas conforme o ‘Meridiano de Greenwich’.

Quando a firma saiu da Capital em 1975, substituída pela Embratel, todos os seus bens foram vendidos ou doados.
Sobrou apenas o velho relógio que foi reinstalado na entrada Norte do vão central do Mercado Público e que funciona até hoje.

Reportagem relacionada:
Relógio inglês do Mercado Público completa 110 anos: para funcionar é preciso dar corda uma vez por semana

(Esta reportagem foi feita baseada no artigo ‘A telegrafia elétrica no Brasil Império’, de Mauro Costa da Silva; ‘Implicações da internet nos jornais e a presença da RBS na web’, de Rogério Mosimann; ‘A era do Cabo Submarino’, de Alexandre da Rocha; A história do telégrafo em Florianópolis, de Walter Pacheco Jr. A imagem de abertura é um mapa de 1860, do acervo do Arquivo Nacional)

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Década de 1920 – Conflito entre ‘taxistas’ de Florianópolis: carruagens perdem espaço para os automóveis

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Há pouco mais de um século, apareceram os primeiros chauffers no Centro de Florianópolis, oferecendo o serviço de táxi nos modernos automóveis.
Até então, esse tipo de transporte era exclusividade dos cocheiros, com suas carruagens puxadas por cavalos.

Por isso, a chegada da inovação provocou o enfrentamento das duas categorias, como aconteceu recentemente entre motoristas de aplicativos e taxistas.

Uma reportagem do jornal Folha Nova, de 1926, mostra a preocupação dos cocheiros com a popularidade do ‘auto’ em detrimento do ‘carro’, como se chamavam antigamente as carruagens.
A nevrose da velocidade e da elegância fez o automóvel rechassar de todas as cidades, quase completamente, a presença dos carros de tracção animal. Raro é a capital, e até mesmo povoado do interior, em que o carro tenha conseguido defrontar o arrogante concurrente”, diz o texto de 18 de novembro daquele ano, disponibilizado pela Biblioteca Pública do Estado, por meio da Hemeroteca.


Mas ainda são procurados pelo público?”, questiona o repórter, ao ‘antigo e estimado cocheiro, sr. Pepino’.
Naturalmente. Os autos nos fazem muito mal, mas estamos nos aguentando”, foi a resposta.
Há muita gente que nos dá preferência. Somos mais baratos e menos vaidosos”.

Chauffers dos modernos táxis (imagem da reportagem da Folha Nova)

Mas, logicamente, em poucos anos os cocheiros acabaram desaparecendo da paisagem de Florianópolis, sendo substituídos pelos chauffers, que dirigiam os inovadores veículos movidos a gasolina.

Confira as exigências para os cocheiros, em 1903 (Jornal O Dia):

Os cocheiros em imagem do jornal Folha Nova

Grave acidente envolve carruagem, em 1908 (Jornal O Dia):

‘Carro’ de luxo transportando autoridades catarinenses, em Florianópolis, no início do século passado (Casa da Memória)

Anúncio de venda, em 1917 (Jornal O Dia):

(A imagem de abertura é acervo da Casa da Memória)

 

 

 

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Forte de Santa Bárbara – Construído numa pequena ilha há séculos, resistiu à modernidade e foi incorporado ao Centro

Por Billy Culleton
No início da década de 1770, uma pequena fortaleza foi erguida para proteger a parte Sul da vila de Nossa Senhora do Desterro.

A acanhada edificação do Forte de Santa Bárbara ocupava grande parte da área de uma diminuta ilha, ligada à região central da cidade por uma pequena ponte em arcos de alvenaria.

O imóvel em 1905 (acervo de Apparecido Jannir Salatini, reproduzido do livro “Ilha de Santa Catarina: Florianópolis”, de Gilberto Gerlach, via site Fortalezas.org)

A fortificação era guarnecida por uma espessa muralha, onde existiam 13 canhões, que nunca foram usados, mas que estavam disponíveis para repelir qualquer navio inimigo que viesse a ultrapassar a Forte de Araçatuba, no extremo Sul da Ilha de Santa Catarina.

Plano espanhol com a vista do Forte, em 1778 (Arquivo do Serviço Histórico Militar de Madrid, via site Fortalezas)

Atualmente, o imóvel, que sofreu várias modificações, é o Centro Cultural da Marinha, no coração do Centro de Florianópolis, na Avenida Hercílio Luz, próximo ao Terminal Urbano.

O imóvel na atualidade (Google Street)

Data inexata
A data exata da construção é desconhecida
O primeiro registro aparece num mapa da cidade de 1774, nomeado como ‘Forte Novo’.

Planta de Desterro em 1774 (Reprodução do livro ‘Florianópolis – Memória Urbana’)

A planta não consta no levantamento das fortalezas realizado por José Custódio de Sá e Faria, em 1760.

O ‘Forte de Santa Bárbara da Praia da Vila’ (nome original)  também aparece no mapeamento realizado, em 1786, pelo Alferes José Correia Rangel.
Nesse documento, é representada com planta no formato de um polígono irregular, levantada em alvenaria de pedra e cal.

Plano espanhol do Forte em 1778 (Arquivo do Serviço Histórico Militar de Madrid, via site Fortalezas)

Sede do governo
Já sem a necessidade de proteção da vila, na primeira metade do século XIX, a edificação serviu como enfermaria militar.

Em 1871, foi demolido o Quartel de Tropa e acrescido um galpão de dois pavimentos, destinado à recepção dos imigrantes que chegavam a Santa Catarina, diz a urbanista Eliane Veiga, no livro “Florianópolis – Memória Urbana”.

Forte quando ainda era banhado pelo mar (Acervo Casa da Memória, via site Fortalezas)

Em 1875, nova reforma no imóvel deu a atual ‘aparência eclética, com frontão clássico e janelas neogóticas’, com o objetivo de abrigar a Capitania dos Portos, que ficou no local até 1999.
Durante o ano de 1893, na Revolução Federalista, é utilizada como sede provisória do Governo do Estado.

Imagem antes do aterro (Casa da Memória)

Novas intervenções
Durante a primeira metade do século XX, novas intervenções foram sendo introduzidas no conjunto, descaracterizando-o completamente e dando-lhe as linhas arquitetônicas características dos anos 30 (que conserva até hoje), informa o site Fortalezas.

A partir da década de 1960, sucessivos aterros no seu entorno acabaram ligando o forte às vias centrais da cidade.

Ao fundo, o primeiro aterro no final da década de 1960 (Acervo Udesc)

Nos anos seguintes, houve um grande debate sobre a possibilidade de sua demolição para priorizar a mobilidade urbana.
A ideia foi rechaçada e em 1984, o forte foi tombado como Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

Entrada do atual Museu Naval, no Centro de Florianópolis (Billy Culleton)

Em 1999, o conjunto foi cedido pelo 5º Distrito Naval ao Município de Florianópolis, passando a abrigar, em 2001, a sede da Fundação Cultural Franklin Cascaes.

Quatro anos depois, retornou à gestão da Marinha do Brasil.

O único canhão exposto na parte externa do Museu (Billy Culleton)

Em 2016, a Marinha reformou a construção, que passou a abrigar o Centro Cultural da Marinha em Santa Catarina e o Museu Naval.

(Esta reportagem foi feita com base em pesquisas no site Fortalezas.org, no livro “Florianópolis – Memória Urbana” e no site da Marinha do Brasil. A imagem de abertura é uma versão colorizada da Vista da Vila de Desterro, de Tilesius von Tilenau, 1803-1804, e é acervo de Paschoal e Ruth Grieco, reproduzido do livro “Desterro: Ilha de Santa Catarina”, de Gilberto Gerlach, via site Fortalezas.)

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Há 65 anos – O misterioso incêndio que destruiu a Assembleia Legislativa no Centro de Florianópolis (vídeo)

Por Billy Culleton
Eram 23h15min, da noite de 17 de maio de 1956, quando a população de Florianópolis foi surpreendida com a movimentação atípica dos Bombeiros, próximo à Praça XV.
Nesse horário o fogo tomou conta de um dos mais belos edifícios da cidade: o Palácio da Assembleia Legislativa, frente à Praça Pereira Oliveira.

Vista lateral da Assembleia: ao lado, a Igreja do Rosário (Casa da Memória)

Construído em 1910, em estilo neoclássico, o prédio de dois pavimentos se distinguia pela elegância e era coroado por uma encantadora cúpula, que sucumbiu pouco depois do início do sinistro.

A 1h da madrugada ouve-se um grande estrondo, semelhante à explosão de uma bomba de grande poder: despegara-se a linda e artística cúpula do edifício, caindo por terra e a tudo abalando. As 2h30 o fogo tinha devorado tudo”, publicou o Jornal O Estado, em 19 de maio de 1956.

O momento do sinistro captado por Waldemar Anacleto publicado pelo Jornal O Estado

Além de ser uma das mais belas e ricas obras de arte, continha em seu arquivo como um patrimônio de grande valor, a documentação de toda a vida legislativa do Estado, desde a primeira Constituinte, diversas obras de arte, rica biblioteca, custosos móveis e utensílios. Reunia, enfim, riqueza incalculável”, completou a reportagem.

A Assembleia contava com uma sala de sessões, com lugar para 39 deputados, galerias para o público, tribuna para o corpo diplomático ou consular, sala para comissões e demais dependências, conta a historiadora Eliane Veras da Veiga, em seu livro “Florianópolis – Memória Urbana”.

O majestoso prédio construído em 1910 (Foto B – Acervo Cid Junkes – Coleção Desterro Antesdonte)

Confira o vídeo da UFSC, com imagens originais do documentarista Waldemar Anacleto, falecido em 2003:

A origem das chamas
O motivo do incêndio continua sendo um mistério, seis décadas depois de ocorrido.
Há muitas suposições, insinuações e suspeitas”, escreveu o jornalista Carlos Damião, em reportagem pelos 60 anos do sinistro e que foi publicada no Jornal Notícias do Dia, em 2016.

Imagem do Arquivo Público do Estado, publicada no livro “Florianópolis – Memória Urbana”

O contexto político daqueles tempos era complicado, mais ou menos como hoje em dia. A Assembleia era presidida pelo deputado Paulo Konder Bornhausen. Ele era da UDN, partido que tinha confrontos pesados com o PSD (controlado pela família Ramos). Os embates eram constantes, com trocas de acusações, ameaças e polêmicas intermináveis. Quem governava o Estado era Jorge Lacerda, eleito por um pequeno partido (PRP), que se coligou com a UDN na eleição de 1955”, continua Damião, acrescentando que o episódio nunca foi esclarecido pelas autoridades.

Divertidamente, como era de seu estilo, o ex-governador Aderbal Ramos da Silva dizia que, por falta de explicação convincente, a edificação ‘sofreu o fenômeno da combustão espontânea’ ”.

(A pesquisa para esta reportagem foi feita nos arquivos dos jornais O Estado, Notícias do Dia e no livro “Florianópolis – Memória Urbana”. E também no documentário “O incêndio da Assembleia Legislativa em 1956”, do Canal Memória da UFSC, que contém imagens originais do documentarista Waldemar Anacleto, morto em 2003)

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Busch & Cia, desde 1880 – O Centro se despede da loja mais antiga de Florianópolis

Por Billy Culleton
Um sentimento de aflição tomou conta de parte da população de Florianópolis, esta semana, ao saber do fechamento da Loja Busch & Cia, na Rua Conselheiro Mafra.

Após 140 anos de atendimento familiar, o comércio de tecidos, forrações e plásticos, fazia parte do cotidiano da cidade e era uma dessas ‘instituições’ que a gente imagina que nunca vai desaparecer.
Mas um dia, acontece…

Fundada em 13 de outubro de 1880, possuía um dos alvarás de funcionamento mais antigos do município, do tempo em que a Capital ainda se chamava Desterro (o nome mudou para Florianópolis em 1894).

Foi o imigrante alemão Wilhem (Guilherme) Busch (1853-1935) que abriu o comércio, instalado originalmente na Rua Trajano, Nº 12.
Trabalhava com calçados e artigos para sapateiros e seleiros, além de ser oficina de conserto de sapatos.
Menos de uma década depois, se instalou na então Rua Altino Corrêa, Nº 14, atual Rua Conselheiro Mafra, onde permaneceu até o fechamento.

Quadro na loja lembra as quatro gerações que antecederam à atual: Wilhem Busch (acima, esq.),Frederico Schmithausen (abaixo, esq.), Frederico Busch Schmithausen (acima, dir.) e
Jorge Michel (Acervo Luciana Michel)

Localizada na frente da antiga Alfândega, a Busch foi se adaptando aos novos tempos e, ao longo das décadas, começou a vender outros artigos, como produtos de vinil, bolhas para embalagens e espumas.

Imagem do Largo da Alfândega, em 1897, onde aparece a Loja Busch (Casa da Memória)

Hercílio Luz era cliente
O proprietário Wilhem Busch mantinha um diário da loja, onde anotava as vendas e o nome dos clientes.
No diário número 1, de dezembro de 1889 (que até hoje a firma conserva), podem-se ver nomes de personalidades que frequentavam o comércio, entre eles, o ex-governador Hercílio Luz, falecido em 1924.

Álvara concedido em 1880 e o diário da loja, de 1889

Fechou, mas permanece aberto!
Atualmente, a loja é administrada pelos irmãos Ricardo e Luciana Michel, da quinta geração da família Busch.
“O motivo para o fechamento da loja no Centro envolve uma série de fatores: um deles é que, como vendemos produtos volumosos, os clientes tinham dificuldade para carregá-los até o carro, já que não há como estacionar por perto”, explica Luciana.

“Além da falta de herdeiros interessados em continuar com o negócio, a pandemia também reduziu bastante o movimento”.

Interior da loja com os centenários balcões para medir os produtos (Acervo Luciana Michel)

O comércio, no entanto, continua aberto no Bairro Kobrasol, em São José, onde foi aberta uma filial na década passada.
“Ali, temos estacionamento na frente da loja”, reforça ela.

Incêndio e novo prédio
Embora localizado no centro histórico da cidade, o prédio na Conselheiro Mafra tem uma arquitetura moderna.
O motivo é que a edificação original foi muito afetada por um incêndio numa loja vizinha, Casas Salum, em 1981.

Fachada da loja antes até a década de 1980 (Acervo pessoal Luciana Michel)

Com a estrutura condenada, a prefeitura concedeu licença para a construção de um novo imóvel, que foi concluído em 1982.
“Vamos alugar o local, não vamos nos desfazer do prédio, não!”, enfatiza a tataraneta de Wilhem Busch, acrescentando que todas as peças relacionadas à história da loja serão levados para o Kobrasol.

Entre os objetos, uma centenária caixa registradora, a balança para pesar os curtumes e a prensa utilizada com os couros há quase um século e meio.

Registradora, prensa e balança (Acervo pessoal Luciana Michel)
Reportagem do Jornal O Estado de 12 de outubro de 1980, feita para o centenário da loja (Acervo Luciana Michel)

(A imagem de abertura é de 1957 e pertence ao acervo da Casa da Memória)

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Os 100 anos da Igreja Santo Antônio, um dos mais aconchegantes templos do Centro de Florianópolis

Por Billy Culleton
Uma chácara abandonada numa colina aprazível e ‘afastada’ da região central de Florianópolis foi o local escolhido pelos padres Franciscanos para construir, em 1921, a pequena e acolhedora Igreja Santo Antônio.
A descrição pode ser encontrada nos arquivos da Terceira Ordem do Franciscanos, ao se referir ao terreno adquirido da família Hoepcke, em 1908, quando os freis chegaram à cidade.

Em 1911, os frades Evaristo Schürmann e Ambrósio Johanning passaram a morar na nova residência, na Rua Padre Schuler, entre a Padre Roma e São Francisco.
Na sequência, ergueram uma capelinha provisória.
Uma década depois, em 10 de abril de 1921, conseguiram inaugurar a acolhedora igreja, próxima ao atual Supermercado Angeloni.

O local, ‘o mais pitoresco da cidade’, segundo os arquivos dos Franciscanos, tinha sido um antigo campo do sanguinário governador interventor em Santa Catarina Moreira César (1894-1898), morto em Canudos.
Os frades compraram uma área de 6,5 mil metros quadrados com duas casas, onde moraram por longos anos e instalaram a capela improvisada, que depois se transformou na bela capela dos dias atuais.

Paróquia
Em 30 de agosto de 1966, foi transformada em paróquia, por decreto arquiepiscopal assinado por Dom Afonso Niehues.

O seu território, totalmente desmembrado da Catedral Metropolitana, abrangia toda a “área de entrada da Ilha, pela Ponte Hercílio Luz”.

A paróquia, então, recebeu o nome de Santo Antônio, por ser este santo filho da ordem dos Franciscanos.
A abrangência também inclui as igrejas Nossa Senhora do Parto e São Francisco, além da capela do Colégio Catarinense.

Escola São José
Um dos objetivos iniciais dos Franciscanos ao se instalarem em Florianópolis era construir uma escola, sonho que se concretizou em 15 de junho de 1915, quando foi inaugurada a Escola São José, na frente da então capela.

Nesta época, o padre Luís Schuler e Frei Evaristo Schuermann, lançaram as bases do que viria a ser o Grupo Escolar São José, naquele tempo, o maior do Estado, com mais de 1,1 mil alunos.
Com o falecimento de Frei Evaristo Schuermann em 1939, a escola gratuita foi transformada em Grupo Escolar para alunos de ambos os sexos e foi entregue a um diretor secular.

O colégio foi criado pelo bispo de Florianópolis, Dom Joaquim Domingues de Oliveira (1868-1967), para atender crianças carentes.

Os freis Franciscanos dirigiam a primeira escola laica do Estado: a igreja construiu e o Estado doou terreno.

Desde o começo, os Franciscanos haviam trabalhado na escola.
Distribuíam não apenas calçados e cadernos aos inúmeros alunos carentes, como ainda lecionavam no Instituto de Educação e no Colégio Coração de Jesus.

Em 1925, faleceram estes dois apóstolos, engajados na causa educacional: monsenhor Francisco Topp e o padre Luís Schuler.
Frei Evaristo tornou-se o herdeiro de ambos: foi nomeado Vigário Geral da Diocese e diretor da Escola Gratuita de São José.

Décadas depois, após ampla reforma, o prédio da Escola São José foi alugada para a iniciativa privada.

Após uma ampla reforma, na década de 1990 a antiga escola abrigou a Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul) e, atualmente, o Colégio Tendência.

(Esta reportagem foi feita a partir de pesquisa nos seguintes fontes: franciscanos, na Revista Vida Franciscana (1964), texto de Frei Querubim Engel, na obra datilografada pelo Frei Oswaldo Furlan, em 1975 (disponíveis na secretaria da paróquia) e nos arquivos da Igreja Santo Antônio.  As imagens históricas são acervo da Igreja Santo Antônio. As atuais, de Billy Culleton)

 

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Década de 1950 – A elegância das florianopolitanas desfilando pelo Mercado Público Municipal

A imagem surpreende e provoca curiosidade.
Seria um desfile de moda?
Ou uma sessão de fotos para alguma loja de roupas ou para uma confecção específica?

A foto das cinco mulheres caminhando pelo vão central do Mercado Público Municipal da Capital foi feita entre 1949 e 1952 e o autor é desconhecido.

O registro faz parte projeto da “Enciclopédia de Santa Catarina“, pertencente ao acervo fotográfico de Almirante Carlos da Silveira Carneiro, militar carioca que, entre 1951 a 1954, dirigiu o 5º Distrito Naval, com sede em Florianópolis.

A coleção encontra-se na Biblioteca Universitária da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

A imagem é identificada por Carneiro como Mulheres caminhando.
Na descrição aparece o seguinte: “Fotografia de cinco mulheres bem vestidas caminhando lado a lado [entre 1949 e 1952]”.

Ao fundo, à esquerda, aparece o prédio da Alfândega e no centro (atrás das mulheres), o muro que demarcava o limite com o mar, antes do aterro.

Mas o mistério sobre a origem da foto continua…
E você, leitor, consegue nos ajudar a saber mais sobre este belo registro?

(Deixe seu comentário ou compartilhe com quem possa esclarecer quem são as mulheres e qual o objetivo da foto: o Floripa Centro vai atualizar a matéria conforme obtenha mais dados).

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Figueirense foi fundado em 1916, para homenagear bairro do Centro, cinco anos antes da criação oficial do clube

Por Billy Culleton
O centenário de um dos mais importantes clubes de Santa Catarina se comemora neste sábado, 12 de junho.
Mas o que poucos sabem é que no dia 11 de dezembro de 1916, um grupo de jovens fundou o Figueirense Foot-Ball Club.

O nome fazia referência ao popular bairro da Figueira, na região central da Capital, como noticiou o Jornal O Dia, em 12 de dezembro daquele ano.
Fundou-se hontem nesta capital mais um Club de Foot-Ball. Os jovens fundadores do novel Club, querendo homenagear o aprasível bairro do Figueira, deram então o nome que serve de epigraphe a esta noticia”, diz a pequena nota, na página 3, do órgão do Partido Republicano Catharinense, intitulada “Figueirense Foot-Ball Club”.

O texto ainda informa que a eleição da primeira diretoria seria naquele mesmo dia.
E conclui: “Ao Figueirense Foot-Ball Club desejamos muitas prosperidades”.
Confira AQUI a página inteira do Jornal O Dia, de 12 de dezembro de 1916.

Nada se sabe sobre o que aconteceu depois disso: não há informações sobre jogos, diretoria etc…

Somente cinco anos depois, em 1921, um grupo de moradores do Bairro Figueira se organizou para ‘refundar’ o clube, numa história conhecida pelos aficionados do futebol.
O Jornal O Estado só publicou a informação 30 dias depois, em 11 de julho de 1921:

Livro faz referência a 1916
A informação sobre a primeira fundação do Figueirense aparece no livro “A história do futebol catarinense”, de Mauro do Canto Machado, falecido em maio de 2021.
“Segundo Machado, existe vestígio da tentativa de criação de um clube de futebol chamado Figueirense, de mesma origem do atual Figueirense Futebol Clube, em publicação de jornal datada de 10 de dezembro de 1916”, escreveu, em 2019  Jailson Gentil da Silva, no TCC “Figueirense Futebol Clube (1999-2010)”, do curso de História da UFSC.

Bairro da Figueira, ao lado do Cais Rita Maria, no início do século passado (Acervo Casa da Memória)

Porém, nem no próprio livro de Machado, e tampouco no acervo do Memorial do Figueirense, encontram-se referências sobre o periódico que publicou a notícia.
(A reportagem do Floripa Centro fez uma minuciosa pesquisa em jornais antigos e achou a informação, até agora desconhecida).

Após aquela notícia do Jornal O Dia, em 1916, “não ocorreram mais quaisquer registros sobre jogos (do Figueirense) ou demais pormenores de sua existência, o que o levou a concluir que sua formação não passou de uma tentativa frustrada”, conclui Jailson da Silva.

Encontramos o local exato da fundação
A história do clube conta que a fundação oficial, em 12 de junho de 1921, aconteceu na Rua Padre Roma, Nº 27.
Porém, nunca se soube onde ficava exatamente esse endereço, já que os números das ruas mudaram e as antigas residências foram demolidas.

Em 2020, o Floripa Centro pesquisou e conseguiu descobrir o local exato da casa de Ulisses Carlos Tolentino, onde aconteceu a reunião para criar o Figueirense.

Como localizamos o antigo endereço?
O Nº 27 da Padre Roma aparece na pesquisa “Cidadania e expectativas no bairro da Figueira: o surgimento do Figueirense Foot-Ball Club”, do professor de História da Udesc Paulino de Jesus Francisco Cardoso.

A rua começa na frente da Rodoviária Rita Maria.
Após o posto de combustível, tem um estacionamento e, na sequência, a tradicional Serralheria Cardoso, que funciona há mais de meio século.
Os funcionários deste comércio, que hoje tem o número 86, informaram ao Floripa Centro que antigamente ali era o número 17.

Atualmente, tem uma moderna loja de celulares (Billy Culleton)

Quando mostramos a foto da residência de Ulisses Tolentino, onde foi a fundação do Figueirense e que consta no site do clube, os trabalhadores da loja foram unânimes em afirmar:
“Era ali na frente, onde agora tem aquela loja de celulares. Era a casa de uma senhora e que foi derrubada faz uns 25 anos. Ela tinha um filho, meio deficiente, que ficava sempre olhando o movimento nessa janela que aparece na foto”.

Atualmente, a loja de celulares é o Nº 119 da Padre Roma.

Imagem histórica do acervo da Udesc mostra a Padre Roma na década de 1920

Confira o vídeo do local da fundação:

E a figueira?
A árvore original, que deu nome ao bairro, estava localizada num morro existente atrás do atual Posto Rita Maria, que já foi uma pedreira, e onde agora existem dois grandes edifícios residenciais.
A figueira ficava 150 metros acima do local da fundação do clube, na Rua Padre Roma, 27.

Imagem do acervo da Casa da Memória e uma foto atual do Floripa Centro

 

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Caso de polícia – Em 1857, o ‘primeiro’ banho de mar no Centro escandaliza a população e vira notícia no jornal

Por Billy Culleton
Numa tarde quente de fevereiro de 1857, há 164 anos, quatro jovens desafiaram as autoridades e entraram nas águas da Praia de Fora, na atual Beira Mar Norte.
A polícia foi acionada para coibir a petulância de tomar banho de mar.

Mas um dos transgressores, que desrespeitou o ‘inspector’, era filho de um conhecido político da cidade e o incidente foi relevado.
Tratava-se de Esteves Júnior, que, posteriormente, se tornaria senador catarinense.
Décadas depois, ele seria homenageado com nome de rua e também da praça próxima de onde aconteceu o ‘delito’.

Busto de Esteves Júnior na praça que leva seu nome, na Beira Mar Norte (Billy Culleton)

Na época, o banho de mar era proibido pelo Código de Postura Municipal.
O artigo 86 era claro. “Fica proibido o uso escandaloso de se mostrarem nas praias, rios ou fontes, pessoas nuas. O que se encontrar desta maneira, sendo livre pagará 4$000 de multa e sendo escravo será castigado policialmente pela competente autoridade”.
Segundo o historiador Oswaldo Cabral, na obra Nossa Senhora do Desterro, o nu não implicava estar sem roupas, mas sim em vestes sumárias.

Praia de Fora no início do século XX em cartão postal (Autor desconhecido)

Notícia
O jornal O Argos repercutiu o mergulho, recriminando a atitude de Esteves Júnior.
Confira alguns trechos do texto “Viva a nossa polícia!”, assinado por ‘um vigia’:

– No dia 11 do corrente em alto dia foram lavar-se na Praia de Fora quatro pessoas entre estas o filho do administrador da Fazenda provincial Antônio J Esteves Júnior e sendo admoestado pelo inspector do Quarteirão respectivo fazendo-lhes ver que o artigo 86 do código de posturas municipais proibia semelhante abuso;

– Foi o inspetor atrozmente desrespeitado pelo senhor Esteves Júnior, dizendo este cavalheiro que se o inspector fosse capaz que o botasse dali para fora, e com palavras obscenas o chamou para a praia, dizendo diante de testemunhas que fosse ou que viesse pegar na vara de inspector;

– No mesmo dia o inspector representou o ocorrido ao senhor delegado, nomeando as testemunhas que presenciaram o crime;

– Consta que o senhor subdelegado ordenou que o inspector retirasse a parte, e assim ficou impune o crime e o senhor Esteves Júnior habilitado a destratar outra vez não só aquele inspector como qual outro e a oferecer-lhe a tal vara!

– Ficou a nossa Municipalidade sem a multa ao passo que por qualquer descuido aplicam ao pobre cidadão o ano do nascimento e o põe a ver jurar testemunhas;

– Ainda haverá quem queira ser inspector de quarteiro? Viva o Patronato! Viva o senhor Esteves Júnior que não deixou encaixar-lhe o artigo 87 do nosso Código Municipal.

Costume mudou em 1920
“Esteves Júnior tinha 25 anos na época e desde os 13 vivia no Rio de Janeiro. Foi a sua convivência com a elite carioca, que já se banhava no mar, que o levou a praticar este ato”, descreve o historiador Sérgio Luiz Ferreira, na dissertação de mestrado ‘O banho de mar na Ilha de SC‘, da UFSC.

Família possa para imagem no início do século na Praia de Santos (Acervo História de Santos)

Segundo ele, a Praia de Fora foi a primeira a ser utilizada regularmente para banhos de mar na Ilha pela elite da cidade, na década de 1920, seis décadas depois do incidente.
Esses banhos eram realizados com as pessoas vestidas, informa Ferreira.

Assim, em pouco mais de um século o banho de mar em Florianópolis passou de delito para momento de lazer, que atrai turistas de todos os cantos do Brasil e do mundo.

(A imagem de abertura mostra a Praça Esteves Júnior antes do aterro da Beira Mar – Acervo da Casa da Memória)

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Histórias do Centro Reportagens Especiais

Construído em 1857 – Antigo leprosário do Centro abrigará o primeiro museu hospitalar de SC

Quase sete décadas após a inauguração do Hospital de Caridade (1789), o elevado número de casos de lepra em Florianópolis obrigou as autoridades a construir o “Asilo para Lázaros”, em 1857.
O casarão foi edificado ao lado do hospital, numa época em que a hanseníase tornara-se frequente e a nova concepção higienista de saúde obrigava a uma remodelação dos espaços públicos.

Como deve ficar o Museu em dois anos (Divulgação Fundação Senhor dos Passos)

Posteriormente, o local foi usado para realizar procedimentos cirúrgicos e também como enfermaria, lavanderia, dormitório das enfermeiras e creche para atender às famílias que trabalhavam no hospital.

Resgate da história sanitária de SC
No espaço, agora, será instalado o Museu Fármaco Hospitalar de Santa Catarina que busca resgatar a memória histórica da Medicina e das práticas sanitárias no Estado.

Funcionárias do hospital no Casarão, no século passado (Divulgação Fundação Senhor dos Passos)

Entre os mais de 1,8 mil objetos que serão expostos há maquinários do século passado, como misturador para pomadas, utensílios cirúrgicos, diversos potes em cerâmica e vidro onde eram guardadas as ervas e compostos químicos para a fabricação de remédios.

Parte do acervo que será exposto (Divulgação Fundação Senhor dos Passos)

O acervo do museu também contará com uma banheira de mármore feita especialmente para a imperatriz Teresa Cristina, quando visitou Desterro em 1845, e que era utilizada por pacientes do chamado ‘casarão’.

A banheiro em bloco único de mármore de Carrara de Tereza Cristina (Divulgação Fund. Senhor dos Passos)

O local contará com um auditório, espaço expositivo e para encontros e palestras, que poderá ser utilizado pelos profissionais da saúde e comunidade em geral.

Captação de verba pelo Imposto de Renda
O Imperial Hospital de Caridade foi a primeira Santa Casa de Misericórdia da Capitania de Santa Catarina e o primeiro hospital civil da Vila do Desterro.

O projeto encontra-se em fase de captação de recursos e está previsto para ser aberto ao público em até dois anos.
Saiba como doar AQUI

Estágio atual da obra (Divulgação Fundação Senhor dos Passos)

(A imagem de abertura é acervo da Casa da Memória de Florianópolis)

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Histórias do Centro

O suntuoso Hotel Metropol, que recebia passageiros dos hidroaviões e intelectuais, como Olavo Bilac

Por Billy Culleton
Uma das edificações mais bem conservadas do Centro Histórico da Capital sediou o tradicional Hotel Metropol, construído na década de 1910, no Centro.
Localizado a 100 metros do Mercado Público, a entrada era na atual Rua Conselheiro Mafra e o prédio se estendia até a Rua Francisco Tolentino, que dava de frente para o mar, na Baía Sul.

Registro do Centro na década de 1920 (Acervo Casa da Memória)

Apesar de sua majestosa arquitetura, o hotel não era luxuoso.
“As unidades habitacionais eram todas iguais: quartos com cama e pia, sendo que os banheiros ficavam localizados externamente, nos corredores de acesso”, descreve a pesquisadora Fabíola Martins dos Santos, em sua dissertação de mestrado da Univali (2005) “Uma análise histórico-espacial do setor hoteleiro no núcleo urbano central de Florianópolis”.

Conselheiro Mafra Nº 45 (hoje 415) era o endereço oficial do Metropol (Billy Culleton)

Na época, não havia serviço de quarto.
O regime de alimentação era o de pensão completa, que consistia no café, almoço e jantar, servidos no salão de refeições”, explica a historiadora.

Anúncio no Jornal O Estado, em 10 de dezembro de 1916, mostrava que pertencia ao cônsul do império austro-húngaro em Santa Catarina, Miguel Tertschitsch, que aperfeiçoou a hospedagem para receber hóspedes que chegavam à cidade de barco pelo Cais Rita Maria.

Na década seguinte, pertenceu a “Moura & Sobrinho”, como atesta anúncio no livreto “Indicador Commercial, Industrial e Profissional do Munícipio de Florianópolis (1°ano, 1928)”, organizado por José Rodrigues Fonseca, sob os auspícios da M. M. Associação Commercial.

Anúncio em 1928 (gentileza Leonan Quadros, Desterro Antesdonte)

Já na década de 1930, o proprietário era José Braunsperger, que anunciou o hotel numa publicação comemorativa do Lyra Tennis Clube, no Natal de 1931.

Anúncio na publicação do Lyra Tennis Clube (Via Leonan Quadros, Desterro Antesdonte)

A propaganda mostrava os atrativos do estabelecimento.
Além da limpeza e ordem, a diversidade do restaurante.
Casa de primeira ordem. Hygiene absoluta. Ordem modelar. Optima Cosinha brasileira e alemã. Grande variedade em bebidas estrangeiras e nacionais

Também ressalta-se a localização privilegiada:
“Situado á beira mar, com bela vista sobre a Bahía sul de Florianópolis. Próximo ao ponto de desembarque dos passageiros da linhas de hydroaviões…”.

Reportagem relacionada: Os hidroaviões em Florianópolis

Também ficava próximo ao ponto de partida das linhas de “Omnibus para Itajahy, Brusque, Blumenau, Jaraguá e Joinville”.

Fachada na Rua Francisco Tolentino, década 1930 (Via Leonan Quadros, Desterro Antesdonte)

Em 1940, o hotel foi arrendado por Hugo Pessi.

Ele foi por muito tempo o maior empresário do ramo da hotelaria da cidade, explorando simultaneamente os hotéis Metropol, Central e Majestic.

O estabelecimento havia pertencido ao Sr. Hanz, um alemão que, em razão da 2ª Guerra Mundial, sentindo-se ameaçado, mudou-se para Blumenau. Foi então que Hugo Pessi, vislumbrando a ideia de expandir seus negócios, aproveitou a oportunidade de arrendamento do hotel”, informa a pesquisadora Fabíola Martins dos Santos.

Fachada atual na Francisco Tolentino (Billy Culleton)

O empreendimento era caracterizado como um estabelecimento que atendia famílias e viajantes, homens de negócios, que permaneciam na cidade por um tempo determinado.

Olavo Bilac almoça no hotel
O restaurante de frente para a Baía Sul costumava receber personalidades políticas e artísticas, como o escritor Olavo Bilac, que visitou Florianópolis em 1916.
Em novembro de 1916, o poeta Olavo Bilac esteve na Ilha por um dia, passeando por ela de automóvel com o governador Felipe Schmidt e almoçando no Hotel Metropol”, conta Gilberto Gerlach, na obra Ilha de Santa Catarina, lançada em 2015.

Foto com a vista atual de um dos quartos do Metropol (Acervo Imobiliária Megam)

Atualidade
A arquitetura do antigo hotel tem uma curiosidade: do lado da Rua Conselheiro Mafra tem três pavimentos e na Francisco Tolentino, quatro.
O fato se deve ao desnível das duas vias, com relação ao mar.

Hoje, o térreo da edificação, nas duas ruas, está ocupado por lojas, enquanto os andares superiores, que já foram utilizados como salas de aula de uma instituição de ensino superior, agora, estão para alugar na Imobiliária Megam.

Quarto nobre, com porta para a sacada e vista para o mar (Acervo Imobiliária Megam)

No anúncio, no site da imobiliária, é possível ter uma dimensão do centenário prédio.

Quarto menor, sem sacada (Acervo Imobiliária Megam)

O primeiro andar está distribuído em sete grandes salas (antigos quartos do hotel) e dois banheiros.
No segundo andar há outras seis grandes salas e quatro banheiros.

Corredor com os banheiros ao fundo (Acervo Imobiliária Megam)

Atualmente, o imóvel conta com elevador e acessibilidade.
O espaço para alugar possui aproximadamente 1000 m² de área privativa e o valor do aluguel é de R$ 25 mil.

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Histórias do Centro

A história do único soldado de Florianópolis que combateu e morreu na Itália, na Segunda Guerra Mundial

Por Billy Culleton
Em 8 de maio de 1944, o florianopolitano Arnoldo Cândido Raulino se despedia definitivamente de sua terra.
Naquele dia, no Centro, houve um grande evento para dar adeus às centenas de expedicionários catarinenses que partiam à Itália para lutar junto aos Aliados na Segunda Grande Guerra.

Formação para a foto oficial na frente da Catedral (Acervo LBV)

Nessa segunda-feira, a concentração foi na frente da Catedral Metropolitana, onde aconteceu uma missa ao ar livre, com a presença dos 956 ‘pracinhas’ catarinenses que foram ao front, autoridades (como o governador Nereu Ramos) e milhares de pessoas, que foram liberadas dos seus trabalhos para prestigiar os catarinenses.

Foto feita desde o campanário da Catedral mostra os militares em formação na escadaria da igreja (Acervo LBV)

Após a celebração, o bispo Dom Joaquim Domingues abençoou os crucifixos que foram entregues aos militares, formados na escadaria da Catedral.

Dom Joaquim e o governador Nereu Ramos (Acervo LBV)

Segundo o “Relatório da Legião da Boa Vontade 1944”, logo depois, o contingente foi desfilando até a Praça Getúlio Vargas (Praça dos Bombeiros) para se encontrar com os alunos das escolas da cidade.
A cerimônia terminou com os discursos do representante dos expedicionários e de autoridades locais.

Homenagem na Praça Getúlio Vargas (Acervo LBV)

Catarinenses
Arnoldo Raulino, então, com 21 anos, foi um dos 47 catarinenses que morreu lutando na Itália, e o único nascido em Florianópolis.
Ao todo, faleceram 28 soldados do Exército e 19 membros da Marinha, conforme aparece numa placa que homenageia os expedicionários mortos de Santa Catarina, na Praça Nossa Senhora de Fátima, no Bairro Estreito, na Capital.

No local, também há um monumento, semelhante a um obelisco, sem nenhuma identificação a não ser os símbolos das três forças armadas.

Praça Nossa Senhora de Fátima: o monumento com os símbolos da forças armadas e a placa com os catarinenses mortos (Billy Culleton)

Vítima de uma mina
Raulino faleceu em 8 de janeiro de 1945.

Única foto de Raulino que se tem conhecimento (Acervo de Rafael José Nogueira, coleção Desterro Antesdonte)

O óbito teria ocorrido acidentalmente enquanto instalava minas terrestres em Torre de Nerone, perto de Monte Castelo, no Norte da Itália.
Seu corpo foi enterrado no Cemitério Militar Brasileiro de Pistóia.
Posteriormente, em 1960, todos os 462 brasileiros que morreram em combate foram repatriados e enterrados no Monumento Nacional aos Mortos da Segunda Guerra Mundial.

Segundo o Jornal O Estado, a mãe de Raulino recebeu uma carta do Exército comunicando o falecimento do filho.

Esta reportagem não conseguiu confirmar a data da publicação no O Estado

O secretário geral do Ministério da Guerra, general Canrobert Pereira, diz que ele morreu “em operações de guerra na Itália”.
É oportuno e confortador saber que o soldado Arnaldo Cândido Raulino, em terras estrangeiras, soube honrar as tradições gloriosas do soldado Brasileiro”, diz o trecho da carta.

Centro ou Coqueiros?
Há uma divergência sobre onde morava Raulino: no Boletim da Força Expedicionária Brasileira de 1948 aparece o endereço “Avenida Rio Branco Nº 199” (atualmente, o número fica próximo a Arno Hoeschl).

Boletim da Força Expedicionária Brasileira de 1948 (Acervo Desterro Antesdonte)

Já o Jornal O Estado, ao divulgar a carta recebida pela mãe do soldado florianopolitano, aponta para o Bairro de Coqueiros.

Ruas no Continente e em São Paulo
O soldado manezinho dá nome a duas pequenas ruas: na Capital, no Bairro Estreito, a via “Arnoldo Cândido Raulino” tem menos de 200 metros e é perpendicular à Avenida Araci Vaz Callado, próximo ao Estádio do Figueirense.

Cruzamento da Rua Arnoldo Raulino com Araci Vaz Callado (Google Street)

Em São Paulo, a rua “Soldado Arnoldo Cândido Raulino” mede cerca de 300 metros e fica na Vila Medeiros, na Zona Norte da cidade.

Monumento (Atualização de 17/5/2021, com base em informações do leitor Silvio Adriani Cardoso)
Arnoldo Raulino tem uma estátua em sua homenagem no Pátio Tenente Coronel Fernando Machado, no 63º Batalhão de Infantaria do Estreito.

Monumento no quartel (acervo particular de Silvio Adriani Cardoso)

Em meados de 1950 foi criado o Centro Excursionista Arnoldo Raulino (CEAR) em homenagem a este ex-expedicionário.

Arte feita no monumento representa o momento da explosão que vitimou Raulino (acervo Silvio Adriani Cardoso)

História
O grupo de catarinenses era só uma parte dos 25 mil integrantes da Força Expedicionária Brasileira (FEB), criada em agosto de 1943 para representar o país nas batalhas da 2ª Guerra Mundial ao lado dos Aliados, para enfrentar o exército alemão.
Até o final da guerra, em 1945, houve 457 combatentes brasileiros mortos na Itália.

(A imagem de abertura é do acervo da LBV. Esta reportagem foi feita a partir da pesquisa no site Taiadaweb, Relatório 1944 da LBV, jornal O Estado e a colaboração dos membros do grupo de Facebook ‘Desterro Antesdonte”)

 

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